Descentralização: a centímetros de um acordo, a quilómetros de uma reforma


António Costa está otimista. Faltam míseros “centímetros”, e não “metros”, para que Governo e Autarquias fechem o acordo para a descentralização de competências. A minha opinião é que, independentemente da medida de distância que seja usada, estaremos sempre a quilómetros de uma verdadeira reforma.


António Costa está otimista. Faltam míseros “centímetros”, e não “metros”, para que Governo e Autarquias fechem o acordo para a descentralização de competências. 

A minha opinião é que, independentemente da medida de distância que seja usada, estaremos sempre a quilómetros de uma verdadeira reforma.

E passo a explicar porquê. 

O que está em cima da mesa, no tal acordo, é uma descentralizaçãozinha. 

É uma versão minimalista do entendimento das competências, faculdades e potencial das autarquias – e das instituições da sociedade civil. 

É um acordo que reflete, sobretudo, preocupações financeiras e uma visão contabilística da política – o campo para onde muitos autarcas, erradamente, levaram a discussão. Há meses, nesta mesma coluna, avisei que a reforma da descentralização estaria condenada se o envelope financeiro fosse o centro do debate. Tristemente, foi ai que chegámos. 

Carregando toneladas de dinheiro europeu às costas – do PRR e do Portugal 2030 – o Governo sabe que precisa das autarquias para executar os fundos sob pena de os perder. 

Por seu turno, os autarcas querem mostrar obra feita. Ter recursos para novas escolas, novos centros de saúde ou equipamentos sociais é tentador. 

A ilusão de que todos ganham é desfeita quando começamos a fazer perguntas. 

Quando os fundos acabarem, que tipo de financiamento está garantido pelo Governo às autarquias? 

Que competências foram transferidas para garantir autonomia de gestão e de processos ao poder local?

E que funções acordámos que seriam mais bem prestadas pelo poder local no lugar do Estado Central? 

Dito de outro modo, de que áreas é que o Estado Central se retirou verdadeiramente, confiando na competência das Câmaras Municipais e das instituições da sociedade civil? 

As respostas a estas questões conduzem, inevitavelmente, a uma reflexão sobre o processo em curso. 

A descentralização é uma filosofia, que tem na sua base o princípio da subsidiariedade, isto é, o de que podemos ter uma melhor decisão e uma melhor administração da coisa pública quanto mais próximo das populações está o poder. 

A descentralização é um processo, que tem na sua base conceitos de eficiência (fazer mais, melhor e com menos recursos), de eficácia (concretização de objetivos) e também de agilidade (mudança mais célere às exigências do mundo contemporâneo).  

E por ser filosofia e por ser processo, a descentralização é verdadeiramente reforma. 

Passar fundos para as câmaras não é descentralizar. 

Transferir recursos sem transferir competências não é descentralizar. 

É reforçar a dependência do assistencialismo do poder central. 

É o Governo a fazer outsorcing nas autarquias para executar fundos.   

Tenho a convicção que esse não é o objetivo de António Costa. O primeiro-ministro que até já foi autarca tem a ambição de liderar “a maior reforma do Estado desde 1976”. Contará sempre com o meu empenho e dedicação para o alcançar. Mas não é com esta versão minimalista da descentralização que o vai conseguir. 

Ainda não é tarde para salvar a descentralização como “pedra angular da reforma do Estado”, para citar novamente Costa.

Na Educação, que o papel das Câmaras não seja apenas o de mestre de obras. Que seja dada uma verdadeira autonomia aos agrupamentos de escolas – ao nível da gestão, na seleção de professores, na elaboração dos currículos. Que as autarquias sejam envolvidas na solução para a valorização das carreiras dos professores, por exemplo com soluções de habitação. [Por exemplo, ainda esta semana recebi um mail de um professor do distrito de Coimbra, colocado em Cascais, a pedir ajuda para mitigar os custos da habitação; solução que só as câmaras podem criar]. 

Na Saúde, que o Governo olhe para as Câmaras como parceiros de referência não só nos cuidados primários – veja-se o sucesso do projeto Bata Branca que, em Cascais, permitiu alargar a cobertura universal de médico de família – mas também nos programas de saúde preventiva através dos programas desportivos, da ampliação de espaços verdes, etc. 

No Apoio Social, que a responsabilidade das Misericórdias como verdadeiros estados sociais locais – dos mais antigos do país, em bom rigor – seja reconhecida e até alargada. 

 Justiça seja feita, depois de décadas de avanços e recuos, de histórias contadas e de promessas por cumprir, tem sido com António Costa e Luísa Salgueiro que a agenda descentralizadora tem avançado como nunca antes deles, com um trabalho de operária da ministra Ana Abrunhosa.

Um bocadinho de descentralização é sempre melhor do que descentralização nenhuma. 

Mas um bocadinho de ambição, também é sempre melhor do que ambição nenhuma. 

Que ela apareça nos últimos centímetros, para que o acordo de descentralização não seja mínimo. 

Descentralização: a centímetros de um acordo, a quilómetros de uma reforma


António Costa está otimista. Faltam míseros “centímetros”, e não “metros”, para que Governo e Autarquias fechem o acordo para a descentralização de competências. A minha opinião é que, independentemente da medida de distância que seja usada, estaremos sempre a quilómetros de uma verdadeira reforma.


António Costa está otimista. Faltam míseros “centímetros”, e não “metros”, para que Governo e Autarquias fechem o acordo para a descentralização de competências. 

A minha opinião é que, independentemente da medida de distância que seja usada, estaremos sempre a quilómetros de uma verdadeira reforma.

E passo a explicar porquê. 

O que está em cima da mesa, no tal acordo, é uma descentralizaçãozinha. 

É uma versão minimalista do entendimento das competências, faculdades e potencial das autarquias – e das instituições da sociedade civil. 

É um acordo que reflete, sobretudo, preocupações financeiras e uma visão contabilística da política – o campo para onde muitos autarcas, erradamente, levaram a discussão. Há meses, nesta mesma coluna, avisei que a reforma da descentralização estaria condenada se o envelope financeiro fosse o centro do debate. Tristemente, foi ai que chegámos. 

Carregando toneladas de dinheiro europeu às costas – do PRR e do Portugal 2030 – o Governo sabe que precisa das autarquias para executar os fundos sob pena de os perder. 

Por seu turno, os autarcas querem mostrar obra feita. Ter recursos para novas escolas, novos centros de saúde ou equipamentos sociais é tentador. 

A ilusão de que todos ganham é desfeita quando começamos a fazer perguntas. 

Quando os fundos acabarem, que tipo de financiamento está garantido pelo Governo às autarquias? 

Que competências foram transferidas para garantir autonomia de gestão e de processos ao poder local?

E que funções acordámos que seriam mais bem prestadas pelo poder local no lugar do Estado Central? 

Dito de outro modo, de que áreas é que o Estado Central se retirou verdadeiramente, confiando na competência das Câmaras Municipais e das instituições da sociedade civil? 

As respostas a estas questões conduzem, inevitavelmente, a uma reflexão sobre o processo em curso. 

A descentralização é uma filosofia, que tem na sua base o princípio da subsidiariedade, isto é, o de que podemos ter uma melhor decisão e uma melhor administração da coisa pública quanto mais próximo das populações está o poder. 

A descentralização é um processo, que tem na sua base conceitos de eficiência (fazer mais, melhor e com menos recursos), de eficácia (concretização de objetivos) e também de agilidade (mudança mais célere às exigências do mundo contemporâneo).  

E por ser filosofia e por ser processo, a descentralização é verdadeiramente reforma. 

Passar fundos para as câmaras não é descentralizar. 

Transferir recursos sem transferir competências não é descentralizar. 

É reforçar a dependência do assistencialismo do poder central. 

É o Governo a fazer outsorcing nas autarquias para executar fundos.   

Tenho a convicção que esse não é o objetivo de António Costa. O primeiro-ministro que até já foi autarca tem a ambição de liderar “a maior reforma do Estado desde 1976”. Contará sempre com o meu empenho e dedicação para o alcançar. Mas não é com esta versão minimalista da descentralização que o vai conseguir. 

Ainda não é tarde para salvar a descentralização como “pedra angular da reforma do Estado”, para citar novamente Costa.

Na Educação, que o papel das Câmaras não seja apenas o de mestre de obras. Que seja dada uma verdadeira autonomia aos agrupamentos de escolas – ao nível da gestão, na seleção de professores, na elaboração dos currículos. Que as autarquias sejam envolvidas na solução para a valorização das carreiras dos professores, por exemplo com soluções de habitação. [Por exemplo, ainda esta semana recebi um mail de um professor do distrito de Coimbra, colocado em Cascais, a pedir ajuda para mitigar os custos da habitação; solução que só as câmaras podem criar]. 

Na Saúde, que o Governo olhe para as Câmaras como parceiros de referência não só nos cuidados primários – veja-se o sucesso do projeto Bata Branca que, em Cascais, permitiu alargar a cobertura universal de médico de família – mas também nos programas de saúde preventiva através dos programas desportivos, da ampliação de espaços verdes, etc. 

No Apoio Social, que a responsabilidade das Misericórdias como verdadeiros estados sociais locais – dos mais antigos do país, em bom rigor – seja reconhecida e até alargada. 

 Justiça seja feita, depois de décadas de avanços e recuos, de histórias contadas e de promessas por cumprir, tem sido com António Costa e Luísa Salgueiro que a agenda descentralizadora tem avançado como nunca antes deles, com um trabalho de operária da ministra Ana Abrunhosa.

Um bocadinho de descentralização é sempre melhor do que descentralização nenhuma. 

Mas um bocadinho de ambição, também é sempre melhor do que ambição nenhuma. 

Que ela apareça nos últimos centímetros, para que o acordo de descentralização não seja mínimo.