Benfica-Liverpool. Os fantasmas que esvoaçam em redor da Luz

Benfica-Liverpool. Os fantasmas que esvoaçam em redor da Luz


Só os jogadores, solidários e fraternos como foram em Amesterdão, podem alterar o absoluto caos em que Veríssimo transformou o Benfica.


Garantem-me que a Luz, hoje à noite, rebentará pelas costuras. Homessa! Quem diria? De onde brotará esta fé que os benfiquistas devotam àquela que é, seguramente, uma das mais frágeis e mais mal treinadas equipas da sua história? Depois daquele descalabro de Braga, com um conjunto caótico no qual havia jogadores que pura e simplesmente não sabiam o que estavam a fazer em campo, há ainda quem acredite em milagres? Claro que, dirão alguns, este Benfica de segunda-apanha, que se arrasta pelo campeonato com apenas mais um jogo ganho (10) do que a soma de empates (4) e derrotas (5), também foi capaz de eliminar o Ajax, vencendo em Amesterdão por 1-0 e realizando uma bela segunda parte na primeira mão, no Estádio da Luz (2-2). Ninguém poderá desmentir este facto. Fica aí, dependurado na parede da história. Mas, convenhamos, o Liverpool é de outra cepa, bem mais poderoso e assustador do que o campeão holandês. E, misteriosamente, desde a eliminatória para a Liga dos Campeões que o Benfica tem vindo a cair numa cada vez mais confrangedora inoperância.

Tenho para mim que o jogo de Amesterdão foi um “jogo de jogadores”. Isto é, o grupo de homens que entrou em campo deu as mãos de forma fraterna e solidária, não atribuindo importância por aí além às ordens que foram dadas pelo banco de defender, defender, defender até caírem para o lado. Defenderam, sim, mas como um todo. Desdobraram-se na camaradagem, cada um pronto a tapar os erros do companheiro mais próximo numa cadeia recíproca de quem quis mostrar que venceriam ou cairiam juntos, como um só.

Superando-se todos nesse louvável esforço colectivo, elevaram as capacidades do conjunto a um ponto dificilmente adivinhável. Poderá isso voltar a acontecer frente ao Liverpool? Já nos habituámos desde sempre à realidade de não haver impossíveis no futebol._Mas serão, mais uma vez, os jogadores capazes de se abstraírem de tudo o que se tem desmoronado à sua volta – e a subida de Nelson Veríssimo ao posto de treinador principal só veio tornar ainda mais visíveis as incapacidades individuais e colectivas do Benfica – para voltarem a ser um conjunto agressivo, corajoso e sem tremideiras? Será na resposta a essa questão que se baseará, para já, o resultado de hoje, na Luz. Depois, em Anfield, será outro jogo.

 

Erros

O mais chocante, para mim, claro está, a opinião é minha e só minha, no trabalho feito até agora por Veríssimo como treinador interino encaixa na total incapacidade de trazer seja o que for de novo ao Benfica. Verdade que o último Benfica de Jorge Jesus já era um caco de porcelana de Estremoz, desfeito ao primeiro toque na derrota das Antas que provocou o seu afastamento. Mas, e depois? Houve por parte dos jogadores uma reacção à alteração de comandante? Definitivamente não! Tornou-se o onze do Benfica mais seguro, mais acutilante, mais digno da camisola que enverga? Não e não! Ao caos, seguiu-se o caos. Atirou-se para o lixo a ideia dos três centrais, mas os golos adversários continuam a entrar pela baliza de Odysseas como gotas de chuva por um tecto mal vedado. Surgiu uma ideia de futebol, com o mais básico da movimentação colectiva, a atacar e defender, que nos desse a sensação de que o único autêntico objectivo da época – chegar ao segundo lugar e entrar directamente na Liga dos_Campeões – ainda seria alcançável? Pelo contrário. Os falhanços foram consecutivos, até na altura em que o_Sporting perdeu pontos e podia ter ficado a apenas três de distância.

O Benfica de Nelson Veríssimo é um enxame de fantasmas que esvoaça como mosquitos tontos em redor da Luz, um gigantesco barco com buracos por todo o casco, semi-afundado numa indigência aflitiva. Com dois jogos com o Liverpool pela frente, e mais dois frente a Sporting e FC_Porto, o naufrágio promete ser doloroso. A menos que, mais uma vez, os jogadores se fechem num abraço de irmãos.