O PCP e o Bloco “condenam” a guerra na Ucrânia. “Condenam” a guerra, mas não condenam a Rússia pela invasão, muito menos se solidarizam com a Ucrânia, e no Parlamento europeu não aprovaram o apoio a esse país. O sofismo no seu lado mais negro.
A invasão da Ucrânia trouxe já graves problemas à actividade económica, agravando o preço da energia, mas não perturbam o nosso Ministro do Ambiente para quem tais dificuldades se resolverão com a energia eólica e solar, e com a poupança nas importações de carvão pelo encerramento das centrais de Sines e do Pego.
O aumento do preço do petróleo faz crescer os impostos sobre os combustíveis penalizando duplamente o cidadão, mas o governo porfia no slogan da redução da carga fiscal, mesmo que paradoxalmente reconheça o seu aumento que classifica apenas de “aparente”, por ser devido ao crescimento económico…
Meros exemplos de afirmações na base de simplismos falaciosos, mas percebidas por muitos como verdades lógicas e indiscutíveis.
Os gregos sofistas do século V a. C. devem estar satisfeitos com muitos dos nossos políticos de hoje. Para eles também a verdade é um conceito muito relativo, e assim artificiosamente manobrável para ludibriar o interlocutor e tornar verdadeiras e vencedoras as causas que defendem. A retórica sofista, que determinava e definia a verdade conveniente, tornou-se decisiva nas disputas políticas de Atenas, com maior força a partir do momento em que os dirigentes, antes ricos proprietários, passaram a ser pagos e a manipulação do povo soberano reunido na “Assembleia” se tornou necessidade para conservação do lugar.
Muitos dos nossos governantes assimilaram bem esses princípios, e se já não defrontam directamente o povo reunido na “ágora”, exponenciam-nos através das modernas redes de comunicação para convencer “assembleia” da nobreza das suas propostas ou esconder os seus erros. Relativizando a verdade, manipulando-a, torturando-a, mesmo descaradamente mentindo, com o objectivo de manter o poder.
Apregoa-se que as energias intermitentes resolverão o abastecimento energético, mas não se diz que o vento é inconstante, que não há sol nas horas de ponta dos fins da tarde ou à noite e, por absurdo, proclama-se que se poupa nas importações de carvão, quando o importamos em forma de electricidade, substituindo o fornecimento das centrais encerradas e desperdiçando o valor acrescentado que trariam ao país. Valor acrescentado que já serve para justificar a entrega de 5 mil milhões de euros à TAP, mas esquece o que resultaria da sua aplicação em apoio a investimento produtivo.
Nega-se o aumento da carga fiscal, classificado como “aparente”, devido às contribuições para a segurança social, efeito do crescimento económico, escamoteando que essa carga é o peso de todas as contribuições no PIB e que o Orçamento é o último garante das pensões. E celebra-se a conquista das contas certas, quando essas contas configuram o mais absoluto desacerto com os Orçamentos aprovados.
Platão criticou a retórica sofista, porque “só é capaz de formar governantes sem escrúpulos…”.
Também agora, políticos sem escrúpulos são os que usam a retórica de “condenar” a guerra na Ucrânia, mas não condenam o invasor, nem se solidarizam com o invadido, nem lhe aprovam financiamentos para meios de defesa. E assim objectivamente condenam quem resiste à invasão e, no seu ódio às democracias ocidentais, atribuem a culpa aos EUA, à NATO e à União Europeia, acusados de promover e apoiar o actual regime xenófobo, belicista e nazi que obrigou a Rússia ao conflito.
A argumentação sofista do PCP e do Bloco quanto à guerra da Ucrânia, similar à da Rússia na ONU que só obteve 4 votos a favor, extravasou todos os limites e é tão brutal na manipulação que terá mesmo dificuldade em convencer os mais duros prosélitos e incondicionais seguidores. É que também na argumentação sofista há um tempo e um modo a respeitar.
E pensar que esses dois partidos foram, até há pouco, os garantes do governo socialista da gerigonça!
Economista e Gestor
Subscritor do Manifesto Por
uma Democracia de Qualidade
pcardao@gmail.com