Exige-se melhores deputados


Manter a mediocridade atual seria péssimo para a democracia.


Nota prévia: a variante Ómicron revela-se menos devastadora do que se temia, como se admitiu aqui há uma semana. Circula muito depressa, mas afeta com menos gravidade sobretudo quem está vacinado. Os hospitais estão a ficar com resposta limitada, mas não é seguro que isso seja consequência só da Covid. Possivelmente, paga-se agora tudo aquilo que se deixou para trás em muitas outras doenças. O SNS nuclear, e aquilo que sustenta a saúde publica em Portugal, como a ADSE e instituições sociais e privadas, constituem um instrumento comum complementar que, por cegueira ideológica, a ‘‘geringonça’’ estragou ao tentar fragmentar. O êxito da vacinação, que em primeira linha se deve à adesão voluntária dos portugueses e só depois à “task force”, não pode esconder o caos que reina na saúde pública e privada em Portugal.

1. Por estes dias, em todos os partidos, discute-se a lista de deputados. É peixeirada garantida, com mais ou menos barulho. É, obviamente, um quebra-cabeças. Há que procurar equilibrar competências específicas, poder político, representação de região, fidelidade ao projeto, capacidade de comunicar e estudar, juntando a isso atributos intelectuais, assiduidade, postura ética, para além da vontade de perseguir o bem comum no respeito pela democracia. Como se vê, é muito difícil encontrar gente com tamanhas qualidades. Por isso mesmo é que, normalmente e em todo o lado, as coisas acabam por ser decididas em jeito de leilão entre os grupos de pressão, ou seja, os caciques que controlam parte dos votos dos aparelhos. Claro que, no meio do processo, entra sempre gente de qualidade, mas em pouca quantidade. Daí que, hoje, a classe política seja vista pela população em geral como uma cambada para não dizer uma corja (avaliação que é em boa parte extensiva a profissões para-políticas como os jornalistas, comentadores, politólogos e muitas outras). Essa visão tem dado azo a que “outras cambadas” cresçam nos extremos da direita e da esquerda, reclamando-se de uma pureza quase cristalina. Fartos isto, muitos portugueses habilitados desistem de ir votar. O retrato é dramático! Nos últimos anos, a qualidade dos agentes políticos degradou-se e chegou mesmo ao nível dos Cabritas, dos Sócrates, dos Robles e dos Branquinhos ou dos Pretos. Eles “andem por aí”, como diz a nossa gente. A democracia exige melhores deputados do que as nulidades que, em geral, se sentam em São Bento. Manter a atual mediocridade seria devastador para a democracia. É pouco provável, mas vamos acreditar que pior é impossível e que o naipe pode melhorar. Se houver mais qualidade geral, há que fazer o esforço de participar na eleição, nem que seja para não criar ainda mais problemas ao presidente Marcelo, que nunca pensou ver-se nuns assados destes. E logo agora que era suposto vir uma catrefada de dinheiro da bazuca (a propósito onde está, com quem e onde andam as informações oficiais sobre isso?). Mais grave do que um impasse pós-legislativas difícil de superar, seria tudo isso acontecer com uma baixíssima participação eleitoral, por causa de um grupo de candidatos sem credibilidade e com estórias tristes no currículo. Candidatos sem perfil são um convite a ficar em casa. Ora, um abstencionista é um apoiante silencioso do mais votado. Uma abstenção na ordem dos 40% ou mais coloca em causa, já não o sistema, mas o próprio regime democrático que está a ser cada vez mais contestado. Veja-se o que acontece em muitos pontos da Europa e do mundo onde as democracias enfrentam sucessivas crises, por estarem a ser defraudadas por oportunistas de toda a espécie e quadrantes. Por cá, nos próximos dias, com as listas de deputados na mão, veremos se podemos ter esperança de melhorar ou se o padrão se mantém. Uma referência objetiva serão os potenciais candidatos a presidente da Assembleia que cada partido integrar. Há poucas figuras que possam estar à altura de uma função que foi exercida por gente como Henrique de Barros (na Constituinte), Vasco da Gama Fernandes, Almeida Santos ou Mota Amaral, entre outros. Mas elas existem no PS e no PSD, uma vez que é natural que o futuro PAR venha de um deles, o que não é obrigatório. Se não for para melhorar, então que, lamentavelmente, lá ficasse Ferro Rodrigues. Haja esperança, mas não excessiva, de que vamos para melhor.

2. António Costa acabou, finalmente, por remover a nódoa Cabrita do governo, para evitar ao PS um rolo compressor de acusações em tempo de campanha eleitoral. Cabrita manifestamente não esperava. Ficou tão traumatizado que só disse baboseiras graves na conferência de imprensa de saída. Tirou-se a nódoa, mas ficou uma mancha enorme no tecido do PS e do Governo. Para o lugar de Cabrita foi nomeada Francisca Van Dunem. Trata se de uma jurista e magistrada, o que faz sentido na Administração Interna, que é a entidade que prepara as eleições. Mas essa razoabilidade deixa de o ser quando se pensa que Van Dunem passa agora, ainda que só por dois meses, a ter uma tutela na área da logística e legislativa da justiça e a ficar com todas as Polícias na sua alçada, da Judiciária à PSP, passando pelo inenarrável SEF. Quanto à seriedade da Dra. Van Dunem, nada a apontar a não ser uma célebre carta enviada para Bruxelas a indicar o nome de José Guerra para procurador europeu, a qual estava cheia de falsidades ou, vá lá, de incorreções, para usar termos do nosso léxico português suave. 

3. Já decorrem e culminam no dia 17 as eleições para a Associação Mutualista Montepio Geral, que controla um enorme património, poupanças de 600 mil pessoas e o banco Montepio. É a maior mutualista de Portugal e vai a caminho dos 200 anos. Nasceu de um propósito generoso de interajuda, que cumpriu, apoiando sucessivas gerações, com método e gestão cautelosa, como convém no mutualismo. Hoje, o grupo Montepio enfrenta dificuldades, porque na última década foi controlado por gente sem qualidade de gestão e sem o sentido solidário que o mutualismo pressupõe. A situação complicou-se ao ponto de se colocar mesmo a questão de não se entender para que serve ser associado ou cliente do Montepio, se nada distingue a organização dos grupos financeiros que por aí andam ou andaram até estoirarem com défices de milhares de milhões. Neste processo eleitoral estão envolvidas várias listas, mas só duas podem vencer. A lista “A” é mais do mesmo. É o prolongamento faustoso da gestão de Tomás Correia e a probabilidade de que os problemas gravíssimos se vão prolongar. Já a lista “D” apresenta um grupo que associa gente da casa, provas dadas, planos de recuperação e capacidade de servir, sendo que integra quem, não sendo do sistema, pode trazer contributos valiosos à causa. Revalorizar o Montepio, repor em prática os valores mutualistas a favor dos associados é o propósito do grupo de pessoas que Pedro Alves conseguiu reunir numa equipa que tem dado a volta ao país com um nível de adesão assinalável. O universo Montepio tem de voltar aos seus valores fundacionais, adequando-se aos métodos de gestão de hoje, investindo e apoiando setores essenciais para o país como o turismo, algumas empresas de setores dinâmico, sem esquecer que tem como propósito primeiro a defesa dos associados e da Pessoa Humana. Dos candidatos à liderança, só Pedro Alves e a sua equipa têm, à priori, a capacidade de aliar essas vertentes. Para que não haja dúvidas, aqui fica também a declaração de interesses de que o signatário integra essa lista numa posição irrelevante, mas que será sempre ativamente vigilante.