O presidente do FC Porto, suspeito de desviar 40 milhões de euros do clube, é a figura central da mega-operação que visou a SAD dos dragões na manhã de segunda-feira, batizada de Operação Prolongamento.
Para já, não foram constituídos arguidos. As buscas serviram para cimentar as provas de um inquérito do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) que decorre desde 2018. Visa desmontar uma rede centrada no núcleo próximo do presidente e que, segundo os indícios existentes na investigação, tem vindo a delapidar os cofres do clube.
As buscas à SAD portista, que decorreram tarde adentro, prendem-se somente com contratos de jogadores de futebol. Contudo, como já avançou o i, este inquérito – encabeçada pelo procurador-geral adjunto Rosário Teixeira, coadjuvado pela Autoridade Tributária (AT) e a PSP – tem duas vertentes. Além dos negócios de transferências, que fazem do presidente do FC Porto o grande alvo da justiça, também é alvo de escrutínio o esquema montado em torno da venda dos direitos televisivos à Altice.
É aqui que entram em cena dois homens intimamente ligados a Pinto da Costa: o filho, Alexandre Pinto da Costa e Pedro Pinho, um amigo de juventude do primeiro, que veio a conquistar a total confiança do líder dos Dragões e protagonizou um episódio nada edificante quando agrediu um repórter de imagem da TVI, em abril, à saída do estádio do Moreirense. Ambos os empresários desportivos foram alvo de buscas.
Os dois amigos, que haveriam de se afastar, terão alegadamente embolsado cinco milhões de euros em comissões com a aquisição dos direitos de transmissão dos jogos dos dragões pela Altice, estando acordado que ainda receberiam mais uma tranche de cinco milhões de euros a partir de 2021, que acabou por nunca chegar. O FC Porto terá ficado assim defraudado em 10 milhões de euros, capital que Alexandre e Pinho receberiam a troco da sua influência junto do clube.
Além dos direitos de transmissão dos jogos em casa do FC Porto, a partir de 2018, durante dez anos, também estava incluído no negócio da Altice a compra dos direitos de transmissão do Porto Canal, durante 12 épocas e meia, a partir de 2016, bem como o privilégio de estampar o seu logótipo no equipamento dos jogadores.
No total, a SAD do FC Porto tinha a receber 457,7 milhões de euros vindos da operadora de telecomunicações franco-israelita. Porém, com o esquema urdido pelos “comissionistas”, a sociedade desportiva viu-se espoliada nos seus proveitos e, consequentemente, nos seus resultados, em 10 milhões de euros.
No que toca à formalização do acordo, há um contrato onde Pinho se comprometia a influenciar as negociações em prol da Altice, estando o papel do filho de Pinto da Costa ausente no documento – talvez porque os negócios de Alexandre, mediando a transferência de jogadores do clube liderado pelo pai, já tinham causando escândalo quando foram noticiados no ano anterior, nos Football Leaks.
Estranhamente, o contrato da comissão seria assinado em abril de 2016, mais de quatro meses depois de ser comunicada a venda dos direitos televisivos pela SAD do FC Porto, quando as negociações em que Pinho deveria ajudar já estavam concluídas há muito – aumentando as suspeitas da investigação de que se tratasse de um contrato por serviços não existentes, para ocultar atividade ilícita.
Seja como for, constituiu certamente um grande passo para a Pesarp, a empresa através do qual Pinho negociou a choruda comissão que recebeu com Alexandre. Afinal, a Pesarp só passou a ter como objeto social o desporto, nomeadamente o futebol, a partir do verão desse ano.
Transferências obscuras Voltando à outra vertente do inquérito, relativa às comissões em transferências de jogadores, aqui também não faltam suspeitas. E, mais uma vez, vê-se o dedo de Pinho, considerado o homem de mão de Pinto da Costa.
Através das empresas – além da Pesarp, ainda há N1 e a PP Sports, que em 2016 ainda dava pelo nome de Energy Soccer e era propriedade de Alexandre Pinto da Costa – Pinho mediou seis negócios do FC Porto só entre 2018 e 2021. Incluindo a venda de Tiquinho Soares ao Tianjin Teda FC, tendo o jogador custado uns seis milhões de euros, bem como a de Yordon Osorio ao Parma, por mais de quatro milhões.
Já a transferência de Ricardo Pereira para o Leicester, por vinte milhões de euros, custou à SAD do Porto 1,3 milhões em comissões à PP Sports de Pinho. Isto parte de um bolo de quase 7,4 milhões perdidos, categorizados como encargos adicionais.
Outro empresário desportivo alvo de buscas foi Bruno Macedo, um conhecido intermediário dos três ‘grandes’.
Como Pinho, Macedo tornou-se um dreno nas contas da SAD do FC Porto. Só em 2019, registou-se que lhe ficaram a dever 3,5 milhões de euros em comissões pela transferência do defesa Éder Militão para o Real Madrid (os merengues pagaram 50 milhões, pouco mais de 28 dos quais foram parar à SAD portista), mais um milhão pela venda do central Felipe ao Atlético de Madrid (custou 20 milhões aos colchoneros). Desde então, Macedo ainda meteu o dedo na contratação de Pepê, ao Grémio, a quarta mais cara alguma vez feita pelo FC Porto, rondando 15 milhões de euros.
Já no que toca a Jorge Nuno Pinto da Costa, não é a primeira vez que é suspeito de se apropriar de dinheiro do seu clube através de transferências de jogadores. Recorde-se que ainda em julho se soube que o presidente do Real Madrid, Florentino Pérez, o acusara de desviar dinheiro da transferência de Pepe para o clube madrileno, em 2007, que custou 30 milhões de euros, como mostrava uma gravação obtida pelo El Confidencial. Quanto ao empresário desportivo Jorge Mendes – sócio no Brasil de Pedro Pinho, através da empresa Vespasiano – Investimentos Imobiliários, segundo apurara o Público – também foi acusado pelo presidente do Real Madrid de participar no esquema.
A megaoperação de ontem contou com 85 homens no terreno. Realizou 33 mandatos de busca, sobretudo no Porto, mas também em Lisboa e Braga. Visou o Banco Carregosa, a SAD, bem como escritórios e residências de dirigentes e empresários ligados aos dragões.