Portugal tem atravessado nos últimos meses uma das piores crises de saúde com que se viu confrontado nas últimas gerações. Não obstante este facto indiscutível, que tem causado a perda de vidas humanas, outros impactos negativos na saúde das pessoas, e a destruição de muito da nossa economia, assistimos ao desgoverno na resposta ao combate pandémico.
Não querendo abordar as questões mais mediáticas, gostaria de trazer para a discussão a inenarrável capacidade, quase vontade, dos nossos governantes e outros políticos de continuarem a repetir erros.
Neste caso em particular falo de ideias que começam a circular na comunicação social sobre a necessidade de trazer a produção de vacinas para território nacional.
O racional, segundo os seus defensores, é permitir produzir vacinas rapidamente e em quantidades suficientes para inocular toda a população.
A intenção de arranjar soluções para vacinar o mais rapidamente possível os Portuguese é um fim meritório, no entanto, temos de ter cuidado em afirmar certo tipo de medidas como a melhor forma de lá chegar.
Se não vejamos, existe um conjunto de razões para as vacinas hoje não estarem a serem produzidas no nosso país, nem em tantos outros, nomeadamente o custo de produção, a especificidade técnica e as cadeias logísticas de distribuição. Isto, para não falar que é uma indústria que necessita de um grande volume de capital, como demonstra o exemplo da Serum Institute of India (um dos maiores produtores de vacinas do mundo) que, em conjunto com a GAVI (entidade financiadora para a produção de vacinas), prevê um investimento inicial de cerca de 1,7 mil milhões de euros para fazer face ao aumento de produção necessária.
Já há muito tempo que é prática corrente da indústria farmacêutica efetuar a produção dos fármacos fazendo uso da capacidade industrial disponível no mundo, complementando os meios próprios de que dispõem, para conseguir corresponder à procura que existe por todo o mundo através do melhor preço. Além disso, existe uma concorrência saudável entre os vários produtores que têm vacinas aprovadas, antevendo-se que a concorrência, com o passar do tempo, tenha tendência a aumentar, visto que é previsível que até ao final do ano tenhamos mais de 20 vacinas aprovadas, e consequentemente, veremos um aumento constante das vacinas disponibilizadas e estabilização do preço por dose.
Então o que aconteceria caso o estado português, por alguma razão, fizesse questão de produzir as vacinas em Portugal?
Bem, nesse caso, poderia já afirmar-se que, com os meios que temos, o seu custo seria mais elevado, uma vez que não temos nem o capital nem as economias de escala que permitam atingir os valores de custo a que atualmente são produzidas as vacinas (caso contrário já estariam a serem usadas pelos produtores mundiais).
Seriamos, então, todos nós a pagar com o dinheiro dos nossos impostos o sobrecusto desta decisão, uma vez que ninguém, no seu perfeito juízo, iria pagar mais pelo mesmo produto que se prevê até ao fim do ano estará a inundar o mercado.
Além disso, existem outras questões: Existe capacidade instalada suficiente para produzir vacinas para toda a população? Conseguiríamos ter as vacinas produzidas para os 10 milhões de portugueses dentro de 6 meses?
Imagino que grande parte destas perguntas terão respostas que fariam até o mais acérrimo defensor desta medida cobrir-se de ridículo.
É por este motivo que o que é esperado do governo é que faça aquilo que lhe compete, que é garantir que em termos logísticos e operacionais nada falha no processo de vacinação e não se meta em mais uma aventura desastrosa com o nosso dinheiro.
Este conselho tanto se aplica ao governo do PS, a partidos como o Bloco de Esquerda, como ao próprio poder local, que à sua escala, tem sido pródigo em medidas irrefletidas de intervenção empresarial, as quais todos nós pagamos, como por exemplo o fabrico de máscaras de proteção individual ou serviços de entrega ao domicílio. Exemplos infelizmente não faltam.
Somos um país endividado de uma forma brutal, onde os recursos que temos têm de ser usados de forma eficaz para apoiar todos aqueles que efetivamente foram obrigados a parar a sua atividade por imposição do governo, ao invés desta inclinação estatista e intervencionista, passe a redundância, de meter o Estado a fazer o que não lhe compete, por não ser sua função ou nem sequer saber fazer.
João Silva de Almeida
Gestor e membro do Iniciativa Liberal