Gosto de Hanói. Velhos cidadãos sentam-seà sombra das amendoeiras que crescem ao redor do lago de Hò Hoán Kiem. Alguns têm, se calhar, idade para ter combatido em Dien Bien Phu sob o comando de Vo Nguyen Giap na batalha mais valente dos Viet Minh. Falam da guerra nesse país de guerra. Também daquela outra guerra contra o sul para lá do paralelo 17. Foi um deles que me contou que quando os americanos foram donos da cidade, as prostitutas de Hanói eram como os judeus nos campos de concentração. Usavam estrelas ao peito impostas pelo serviços sanitários do exército dos Estados Unidos: se fossem amarelas, não havia riscos; se fossem vermelhas era porque sofriam de alguma doença venérea que aconselhava a quarentena. Parece que as das estrelas vermelhas eram muito requisitadas pelos soldados, que só queriam desabafar a angústia que os consumia.
Em Hanói, as meninas passam de bicicleta muito direitas, de joelhos em vaivém. Outras preferem motoretas e sentam-se de lado, com os joelhos muito juntos. Perdem-se no tráfego frenético. Do ruído insuportável das buzinas constantes ao soar quase infantil das campainhas das bicicletas. Gosto dos ca phés deHanói, onde os velhos cidadãos que saem da sombra das amendoeiras se sentam pela noite dentro em conversas infinitas. Ignoram as mulheres que passam, dobradas ao peso dos quang ganh, uma vara que lhes cobre os ombros e tem, em cada ponta, um cesto de vime onde carregam tudo o que conseguem carregar, desde legumes a galinhas, vivas ou mortas. Gosto de Hanói e das lendas de Hanói. Não sei porque me lembrei da história das mulheres e das estrelas. Percebo os soldados que escolhiam as das estrelas vermelhas e falavam da sua tristeza, da sua saudade. Eram daquele género de homens que sabem que o sexo é apenas um carinho que foi até ao fim…