Juan Gómez-Jurado. “O thriller é uma metáfora perfeita do século XXI”

Juan Gómez-Jurado. “O thriller é uma metáfora perfeita do século XXI”


Diz que se inspirou numa recordação de infância para criar Antonia Scott, a protagonista do livro Rainha Vermelha (ed. Planeta), de quem escreveu uma biografia de 800 páginas. Garante que esta mulher “apaixonante” já existia fora dele. “Limitei-me a descobri-la”.


Disse numa entrevista que escreveu uma biografia de quase 800 páginas de Antonia Scott, a personagem principal, antes de começar a escrever esta história. Este livro converteu-se numa obsessão?

Escrevi essas 800 páginas porque precisava de encontrar Antonia Scott. É um ser humano apaixonante e muito especial, cheio de recantos e de matizes. Algo assim não surge do nada.

Passa sempre tanto tempo a preparar uma personagem ou este é um caso especial?

Isto pode parecer estranho ou esotérico, mas não tenho outra forma de o explicar, lamento. Antonia já existia antes de eu a encontrar. Existia fora de mim, na obscuridade, uma mulher assim, cuja história nunca tinha sido contada. Limitei-me a descobri-la pouco a pouco.

E quando começou a desenhar-se na sua cabeça esta personagem específica?

Com uma recordação de infância. Quando tinha nove ou dez anos, conheci um dia numa praia uma menina um pouco mais velha do que eu e que era muito, muito inteligente. Enquanto falávamos, o pai dela aproximava-se de vez em quando para lhe propor quebra-cabeças matemáticos, e ela resolvia-os sempre. Lembro-me de que a possibilidade de falar com alguém tão inteligente me deixou fascinado. E quis que esta personagem fosse exatamente assim.

Stephen King já disse que realmente não sabe de onde vêm as boas ideias, que simplesmente encontram o seu caminho até aos escritores. Concorda?

Completamente. Por isso julgo que, de um ponto de vista científico, pode parecer uma coisa mágica, mas não encontro outra explicação para dar.

Foram vendidos mais de um milhão de exemplares de Antonia Scott em Espanha. A que atribui este sucesso, o que pensa que atraiu os leitores?

Os próprios leitores. Algo assim não pode ser explicado, criado, gerado a priori, apenas pode ser racionalizado a posteriori. Por isso insisto tanto que Antonia Scott não é minha, não me pertence, existe fora de mim e pertence aos leitores.

O thriller foi sempre o seu género literário favorito?

Um dos favoritos. Gosto muito do thriller porque me parece que é uma metáfora perfeita do século XXI. Serve – ou pelo menos as suas regras – para o explicarmos muito bem. No western há uma história de fronteira, numa comédia romântica deves ter uma série de enredos que separam os protagonistas até dois terços da história, e o thriller tem três regras básicas: o perigo físico, o perigo social e o relógio em contagem decrescente. E essas três regras parecem-me um reflexo da vida que vivemos no século XXI, é uma metáfora.

Continua a trabalhar como jornalista?

Mantenho alguma colaboração nos diários, mas hoje em dia não posso considerar-me jornalista.

Como foi a sua passagem pelos jornais?

Muito bonita, muito interessante, uma aprendizagem dura mas imprescindível. Devo muito a todos aqueles com quem aprendi, entre eles os meus mentores no jornalismo.

Em que medida contribuiu para o seu despertar como escritor?

Ajudou-me a encontrar a concisão, a precisão e a fazer as coisas o melhor que sabia. São ferramentas fundamentais, tanto na literatura como na vida.

A nota biográfica que acompanha os seus livros refere a quantidade de seguidores que tem nas redes sociais. Por que considera que isso tem importância? Hoje escrever um bom livro já não é o suficiente?

Não é quando se escreve um bom livro que tem lugar um ato cultural – é quando alguém o lê. Chegar aos leitores, por qualquer meio disponível, é parte do meu trabalho e a razão de ser da minha vida. Sinto-me orgulhoso e satisfeito por poder partilhar essa experiência com cada um dos leitores nas redes.

Gostaria de ver os seus livros adaptados ao grande ecrã?

Gostaria muito e essa é uma das minhas grandes frustrações, há muitos anos. Nunca deixei de o tentar, sem qualquer sucesso. Até aqui tínhamos procurado uma maneira de adaptar os meus romances ao cinema em Hollywood, e cada vez que o tentámos fracassou, porque não se conseguiu arranjar financiamento. Agora vou fazer ao contrário, daqui para lá, porque no resto do mundo há um maior interesse em relação ao que vem de Espanha, tanto no mercado literário internacional, como no do cinema, como na sociedade em geral.

Quais são os seus próximos projetos?

Se eu te dissesse, teria que te matar.