Quem passa hoje pelas ruas da Matinha, em Marvila, vê um pouco da história desta zona da capital que em tempos tanto dinamizou Lisboa. Situada junto ao rio Tejo, a Matinha foi, em tempos, o centro de operações da indústria lisboeta, contando hoje com uma imagem totalmente distinta daquela que se vislumbra a apenas algumas centenas de metros dali, no Parque das Nações.
Um muro, gasómetros, antigas fábricas, uma linha de caminho-de-ferro, um cais e vários metros de terrenos gastos e sem qualquer tipo de utilização neste momento. A Matinha não é só isto. A Matinha tem muita história que marcou a freguesia de Marvila. Mas a Matinha também está prestes a sofrer uma remodelação extrema que irá alterar por completo a forma como a zona é vista e vivida.
Ora, depois da Prata vem a Matinha. A VIC Properties – empresa de empreendimentos imobiliários – está a seguir o modelo do Prata Riverside Village e a implementá-lo na Matinha, o que permite fazer uma comparação e criar, assim, uma imagem do que acontecerá a esta zona.
Em 2004, a Gesfimo encomendou o plano de pormenor da Matinha ao ateliê Risco – coordenado por um dos filhos do antigo vereador do Urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa, Manuel Salgado.
O arquiteto responsável pelo desenho da nova Marvila é Renzo Piano, que conta com obras espalhadas por todo o mundo, como é o caso do Centro Georges Pompidou, em Paris, e do Centro Cultural Tjibaou, na Nova Caledónia.
A VIC Properties chegou a Portugal e começou a investir em Marvila. O início foi o Prata Riverside Village, em Braço de Prata, que está hoje ainda em desenvolvimento, mas o próximo passo é agora a Matinha. Contudo, a empresa está a planear algo bem mais grandioso do que algumas paredes de betão, almejando uma área residencial e de comércio construída de raiz.
No total serão dez lotes de apartamentos, que serão acompanhados por uma vasta comunidade viva e servidos por comércio, serviços, equipamentos culturais e áreas verdes. O objetivo passa por fazer desta zona uma autêntica vila, equipada com lojas, restaurantes, galerias, pistas de bicicleta e parques infantis.
Serão várias as novidades que trarão uma nova vida a esta zona oriental da cidade. A primeira é a criação de um estacionamento público de superfície, que está prestes a ser finalizado e que contará com postos de carregamento elétrico, e ainda outro de utilização pública, situado no piso -1. São também já visíveis novos parques infantis e ciclovias, presentes em cerca de 10 hectares de área verde.
A estes juntam-se um espaço multiusos com 2500 m2, uma zona de fitness & wellness, que incluirá uma piscina e/ou spa para o condomínio e comunidade visitante, um lote destinado a escritórios e até um hotel. A praça central será o epicentro do loteamento da Matinha e contará com um mercado, restaurantes e locais destinados à realização de eventos. Há ainda a possibilidade de vir a existir um jardim botânico e uma catedral ou uma igreja num espaço cedido pela VIC.
Nem tudo são boas novas e há, como sempre, algumas preocupações. Uma das grandes problemáticas que envolviam a zona da Matinha era mesmo a descontaminação dos seus terrenos, uma vez que esta é conhecida pelos seus famosos gasómetros que, até ao final do séc. xx e à desindustrialização, tanto marcaram a zona, seja economicamente, seja a nível ambiental. Contactada pelo i, a VIC Properties explicou que esta é a sua “primeira preocupação no desenvolvimento deste projeto” e que irá, assim, começar a descontaminação dos solos este ano, “o mais breve possível”. Só depois disso o empreendimento da Matinha poderá avançar. Os três gasómetros que hoje ainda ali existem permaneceram “para preservar a memória da indústria que lá existiu”.
O investimento da VIC Properties começou no Braço de Prata, com o seu megaempreendimento Prata Riverside Village, que até 2023/24 trará cerca de 700 novas habitações àquela zona ribeirinha de Lisboa. Para além desta zona habitacional, cerca de 20 mil metros quadrados estão reservados para área comercial nos pisos térreos de todos os lotes e mais de 7 mil estão destinados a serviços. O investimento ronda os 400 milhões de euros, entre aquisição e construção.
Preço não é para todos
Contudo, por mais comodidades que estes novos empreendimentos tenham, o seu preço acompanha o seu luxo. Segundo a VIC Properties, “é expetável que os preços no empreendimento da Matinha sejam inferiores aos do Prata”. Ora, segundo o portal da Remax, entre os apartamentos que estão ainda disponíveis no Prata existe uma grande variação, com preços entre os 300 mil euros – para um T1 com 52 metros quadrados – e um milhão e 600 mil euros – para um T4 com 257 metros quadrados.
De resto, estes valores são dos que mais preocupam a população, uma vez que podem levar a que os preços de arrendamento na zona subam e as pessoas sejam, assim, obrigadas a sair por forças de ordem superior. A maior oferta de comodidades na zona poderá até levar alguns proprietários a não renovarem contratos com os seus inquilinos, com o objetivo de vender os terrenos no futuro.
Entre as principais críticas apontadas pela população que hoje habita na Matinha está ainda o facto de este novo empreendimento poder levar ao desaparecimento de várias das empresas criativas como, por exemplo, aquelas ligadas às artes e à música, que ali cresceram e vinham sendo desenvolvidas nos últimos anos. No entanto, ao i, a VIC Properties assume-se como “uma grande defensora da arte e das inúmeras expressões culturais “ e esclarece que “os seus espaços comerciais estão abertos a empresas criativas que aí se queiram instalar”, visto que o seu objetivo passa por ter comércio no rés-do-chão dos seus novos edifícios.