A Humanidade enfrenta hoje o tremendo desafio de alimentar uma população ainda crescente, limitando os efeitos da agricultura no clima, na biodiversidade e nos ecossistemas, adaptando-a às alterações climáticas e protegendo a sua base produtiva, o solo.
O sistema das pastagens semeadas biodiversas é uma solução desenvolvida em Portugal com capacidade para contribuir para a resposta este desafio. Baseia-se no uso massivo de biodiversidade, sendo semeadas em cada local até 20 espécies ou variedade de leguminosas, gramíneas e outras espécies pratenses, numa mistura adequada às características edáficas e climáticas de cada local.
No âmbito do Projecto Terraprima – Fundo Português de Carbono, envolvendo mais de 1000 agricultores, foram semeados cerca de 50 000 ha destas pastagens. O promotor principal deste sucesso foi a remuneração dada ao sequestro de carbono no solo obtido através do aumento da matéria orgânica neste. No entanto, foi também considerado como muito importante pelos agricultores a disponibilização de apoio técnico, com visitas frequentes ao terreno pelo técnico do projecto.
O sistema tem um enorme potencial de expansão sendo, nomeadamente, preconizada a sua expansão no âmbito do Roteiro de Neutralidade Carbónica aprovado em 2019. No entanto, esta expansão carece da capacidade de responder a alguns desafios levantados por este sistema.
A riqueza do sistema em leguminosas é uma componente fundamental do sistema, pois as leguminosas têm a capacidade única de fixar azoto da atmosfera, evitando o uso, ambientalmente muito problemático, de adubos azotados. Esta capacidade é particularmente elevada nas leguminosas pratenses (quando comparada com as leguminosas para alimentação humana). No entanto, esta riqueza tem um preço: as leguminosas são exigentes em fósforo, um nutriente escasso na generalidade dos solos portugueses. Assim, este sistema precisa de adubação com fósforo, que representa um custo que precisa de ser optimizado.
Este sistema vive também de um equilíbrio adequado entre leguminosas e gramíneas: as leguminosas são necessárias para fornecer azoto (sendo grandes fornecedores de proteína aos animais) e as gramíneas são utilizadoras deste azoto (sendo grandes fornecedoras de energia aos animais). No entanto, as gramíneas pratenses (plantas da mesma família que o trigo ou o centeio) crescem em porte erecto (na vertical), enquanto as leguminosas crescem em porte prostrado (junto ao chão). Assim, o pastoreio é necessário para controlar as gramíneas e evitar que “abafem” as leguminosas. No entanto, pastoreio em excesso levará à perda de toda a pastagem. Temos assim um equilíbrio difícil de gerir, que a generalidade dos agricultores ainda não domina.
A necessária existência de pastoreio num sistema de pastagens implica a presença de ruminantes, animais como bovinos, ovinos ou caprinos, cujo sistema digestivo tem a capacidade de processar alimentos ricos em celulose, como o são as plantas das pastagens. A desvantagem deste sistema digestivo é que tem associada a produção de metano, um gás com forte efeito de estufa, sendo necessário optimizar a alimentação e a gestão dos animais para minimizar a produção de metano por unidade de leite ou de carne produzidas.
Finalmente, temos o problema social da falta de atractividade em trabalhar neste sector da produção animal extensiva. As pessoas preferem trabalhar, por um salário mais baixo, num banco ou num supermercado do que trabalhar na agricultura. Assim, para que este sistema funcione adequadamente, é preciso atrair jovens que queiram trabalhar nele.
Todos estes desafios podem ser abordados através do que podemos designar como Agricultura 4.0 Sustentável, a combinação equilibrada dos três pilares da sustentabilidade (ambiental, social e económico) com a abordagem tecnológica intensiva da Indústria 4.0. A aplicação desta abordagem ao sistema das pastagens semeadas biodiversas será aqui objecto de um futuro artigo.
Professor de Ambiente e Energia no Instituto Superior Técnico