O proTEJO – Movimento pelo Tejo propôs este domingo uma revisão da Convenção de Albufeira com Espanha, por forma a aumentar o caudal do rio Tejo através do estabelecimento de caudais ecológicos contínuos e regulares, medidos em metros cúbicos por segundo e distribuídos sazonalmente ao longo do ano. Segundo Paulo Constantino, porta-voz do movimento, “havendo esta gestão regular, em princípio não acontecerá o que aconteceu este ano hidrológico, a não ser que haja uma seca muito grande e não haja água para enviar”.
Ao i, o porta-voz do proTEJO explicou que a Convenção de Albufeira, atualmente em vigor entre Portugal e Espanha, apenas distribui 37% – o equivalente a 995 hm3 – do caudal anual estipulado (2700 hm3) por trimestres e semanas, de acordo com as estações do ano. “O que nós queremos é que os caudais sejam distribuídos totalmente, e assim, através desta melhor gestão, possamos triplicar os caudais contínuos e regulares do rio Tejo”, refere.
Caudais pretendidos “não são suficientes”
Ao jornal Público, o Governo considerou que a gestão que Espanha fez dos caudais neste último ano hidrológico “não é aceitável” e que “Portugal já referiu de forma clara a Espanha que vai reforçar a sua atitude na próxima reunião plenária da Comissão para a Aplicação e o Desenvolvimento da Convenção de Albufeira, propondo o incremento de mecanismos de controlo que permitam evitar no futuro situações desta natureza”. No entanto, o proTEJO considera que os caudais diários pretendidos pelo Governo não são suficientes. “É preciso distribuir 100% do caudal anual pelos trimestres e pelas semanas e estabelecer, em função desses valores, os caudais contínuos e regulares em metros cúbicos por segundo”.
Para Paulo Constantino, o principal problema do atual modelo da convenção é que os 63% restantes, o correspondente a 1805 hm3, “podem ser enviados por Espanha quando bem lhes apetecer, é o caudal que os espanhóis têm livre para enviar quando quiserem”. “Se eles quiserem, enviam essa quantidade de água toda numa hora e nós queremos que essa percentagem não seja tão grande porque, se ela for menor, Portugal terá um caudal garantido maior”, afirmou o ambientalista.
Na opinião do porta-voz do proTEJO, as empresas de produção de energia hidroelétrica, como a Iberdrola, têm a sua quota-parte de culpa nesta situação. “Sessenta e três por cento do caudal está a ser deixado ao livre arbítrio das barragens hidroelétricas da Extremadura espanhola, que só enviam água quando lhes é mais rentável para produzir energia”, ou seja, quando existem picos de preços no mercado de energia. Segundo o movimento, “este objetivo apenas poderá ser colocado em causa se houver corrupção dos Governos e se se deixar em rédea livre a ganância das empresas hidroelétricas”.
Num comunicado enviado às redações, este movimento pelo Tejo explica que foi exatamente isso que sucedeu este ano, em que Espanha enviou cerca de 38% do caudal integral anual de 2700 hm3 nos últimos três meses do passado ano hidrológico, ou seja, entre julho e setembro. Foi este vazamento de uma grande quantidade de água que levou à diminuição drástica do nível da barragem de Cedillo que, por sua vez, levou a que afluentes do rio Tejo ficassem secos – como é o caso dos rios Pônsul e Sever – e que o próprio Tejo internacional diminuísse cerca de 20 metros de altura em certas zonas. Há inclusive relatos dos últimos tempos de zonas do Ribatejo onde se consegue atravessar o rio a pé.
“Continuada e extensa falta de água”
Quanto aos prejuízos causados por esta situação e a má gestão dos caudais do rio Tejo, Paulo Constantino reforçou que agora é muito importante que chova em grandes quantidades. “Se neste inverno não chover bastante teremos vários prejuízos a nível ambiental, com uma continuada e extensa falta de água. Também as atividades económicas terão problemas, pois deixam de ser exercidas, como é o caso de hotelaria, turismo e atividades piscatórias, que são muitas vezes a subsistência das pessoas que vivem naquela zona. Por fim, teremos ainda prejuízos em termos sociais, das vivências das populações”, explicou.
O Programa do xxii Governo Constitucional – aprovado no passado dia 26 de outubro pelo Conselho de Ministros, prevê a revisão da Convenção de Albufeira com Espanha por forma a garantir caudais diários nos rios transfronteiriços e uma “gestão comum das massas de água comuns”.
Os Governos português e espanhol irão encontrar-se este mês com vista a discutir e rever a Convenção de Albufeira e se esta foi ou não cumprida no último ano hidrológico – de outubro de 2018 a setembro de 2019. Paulo Constantino defende que Espanha não cumpriu a convenção e confessa que “gostava que o Ministério do Ambiente apresentasse a possibilidade de existirem os caudais diários para além dos trimestrais e dos semanais, mas que houvesse a distribuição de 100% do caudal anual pelos trimestres e pelas semanas”. “É isso que estamos a apresentar, no fundo, com as nossas contas”, conclui.
O tema da diminuição do caudal do Tejo internacional já vem aparecendo na agenda pública desde o início do mês de setembro, altura em que o movimento proTEJO acusou Espanha de não ter cumprido os caudais mínimos estabelecidos na Convenção de Albufeira. Mais tarde, o Ministério do Ambiente veio contrariar esta acusação, dizendo que os mínimos tinham sido cumpridos. Desde então surgiram vários relatos de zonas a ser afetadas pela diminuição do caudal, com afluentes como os rios Pônsul e Sever a encontrarem-se praticamente secos.