Doenças cardiovasculares, hipertensão e cancro são doenças que podem ser evitadas se o sal for afastado dos pratos. É preciso reduzir o consumo de sal, mas nem todos o fazem. Aliás, os portugueses consomem o dobro da quantidade de sal recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS): a dose ideal é de 5,8 gramas por dia e em Portugal ingere-se, em média, 10,7 gramas de sal. Há inúmeros estudos a nível mundial sobre o tema, mas até agora não existia, em Portugal, um estudo capaz de evidenciar em termos práticos o bem que a redução de sal faz à saúde.
Apresentado ontem, o estudo sobre o consumo de sal, feito no âmbito do Programa Menos Sal Portugal por investigadores da Nova Medical School e da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, mostrou isso mesmo: em 12 semanas, 300 adultos, escolhidos aleatoriamente, mudaram os hábitos alimentares, começaram a comer mais fruta e legumes, reduziram a quantidade de sal – em cerca de 0,6 gramas por dia – e aumentaram a quantidade de potássio ingerida. Resultado? Benefícios para a saúde, sobretudo “em grupos de maior risco”, referiu ao i o prof. Jorge Polónia, um dos coordenadores do estudo.
O facto de existirem poucos estudos sobre o tema está relacionado precisamente com a “dificuldade que há em intervir numa população mudando exclusivamente hábitos alimentares”.
E a falta de informação que existe relativamente ao sal é ainda uma realidade, segundo explica o investigador. “Este grupo, do ponto de vista escolar, é de uma escolaridade elevada”, diz, completando: “Apesar disso, as pessoas tinham muita carência de informação – sobre como ler os rótulos e sobre que tipos de condimentos podem substituir o sal mantendo um paladar agradável”.
Vegetais, fruta, legumes, menos sal, mais potássio e… resultados Primeiro, é importante perceber os malefícios e os benefícios dos dois grandes protagonistas do estudo: o sal e o potássio. Se, por um lado, o excesso de sal aumenta as hipóteses de acidentes cardiovasculares e de pressão arterial elevada, a falta de potássio pode provocar, além de fraqueza muscular, um aumento do açúcar na corrente sanguínea e, no limite, levar a paragens respiratórias. Então, é preciso apostar em alimentos ricos em potássio – banana, laranja, beterraba, abóbora, melão ou abacate são bons exemplos de alimentos com grande concentração de potássio.
Ao longo das 12 semanas, a alteração dos hábitos alimentares permitiu reduzir a pressão arterial dos participantes, o que, para o investigador da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, “é, de facto, impressionante, porque pode traduzir-se, de uma maneira muito clara, numa redução muito significativa de acidentes cardiovasculares”.
Os 300 participantes no projeto, lançado no início do ano, foram acompanhados por profissionais de saúde e, na hora de ir às compras, não estiveram sozinhos. Vários nutricionistas ensinaram a ler rótulos e a escolher alternativas ao sal, como a salsa, o alho ou a batata-doce. E foi muito graças a esse acompanhamento que foi possível este primeiro estudo populacional em Portugal. Houve uma monitorização rigorosa do consumo de sal e potássio 24 horas por dia.
Colocar de lado a comida processada e levar para o prato legumes, vegetais, peixe, frutos secos e hortaliças era um dos desafios lançados pelos investigadores.
“Sobretudo para nós, que somos académicos, este estudo é muito bom, porque aquilo que nós dizemos na teoria fica comprovado na prática”, referiu Jorge Polónia. O investigador acrescentou que o estudo “serve de lição para muita gente” e que mudar os hábitos “não é assim tão difícil”, até porque foi possível ensinar três centenas de pessoas em apenas três meses.
Em termos práticos, Jorge Polónia referiu ainda que mulheres com excesso de peso conseguiram reduzir significativamente o perímetro abdominal só com alterações nos hábitos alimentares.
Evitar o uso de medicamentos As pessoas que têm tensão arterial superior ou muito próxima do limite normal – e que constituem o grupo de risco do estudo – são as que mais beneficiam se optarem por uma alimentação com menos sal e mais potássio. Uma das conclusões da análise indica que este grupo de pessoas pode conseguir evitar que se desenvolva hipertensão arterial. “Isso pode atrasar o uso de medicamentos e pode, para quem já está medicado, potenciar o efeito desses medicamentos”, explicou o investigador da Faculdade de Medicina do Porto. Aliás, para Jorge Polónia, a intervenção nos grupos de risco deve ser feita “do ponto de vista preventivo, e não farmacológico”.
Traduzindo as conclusões em números, o estudo conseguiu “numa população de maior risco diminuir a pressão em quase nove milímetros de mercúrio”, referiu Jorge Polónia, acrescentando que isso “é algo extraordinário”. Para a restante população, a redução da pressão fixou-se nos dois milímetros de mercúrio, o que “pode corresponder a menos 10% de risco de acidente vascular cerebral”.