Cristiano Ronaldo foi embora, de regresso àquele país que é o que o mar não quer, nas palavras de Ruy Belo, ou mais provavelmente para lá perto, para Espanha, onde continuará a ser sempre um incompreendido. Neste Mundial, com muito de frustrante para a seleção nacional, conseguiu algo que, antes dele, apenas dois portugueses tinham feito: marcar três golos num jogo. Como Eusébio em 1966, frente à Coreia do Norte (que foram quatro), e como Pauleta em 2002, frente à Polónia. Com 47 golos, Pedro, o açoriano, ainda é o segundo melhor marcador de sempre da equipa das quinas.
Lembras-te do dia em que bateste o recorde do Eusébio em golos pela seleção?
Claro que sim! No Porto, contra a Letónia, último jogo de classificação para o Mundial 2006. Um dos dias mais felizes da minha vida! Bater o recorde do nosso Eusébio é obra!
(Abro um parêntesis para concluir o episódio. Já na cabina, depois do jogo, o meu telemóvel tocou. Era o Eusébio: “Afonso, o Pauleta tem o telemóvel dele desligado, passa-mo aí, preciso de lhe dar os parabéns, queria ser o primeiro!” Eusébio era assim, o céu o guarde.)
Que sentiste nesse momento?
Um orgulho enorme! A ideia de que tinha cumprido um objetivo muito importante para mim e que entrava na história do futebol português.
E, já agora, que sentiste quando, por sua vez, o Ronaldo bateu o teu recorde?
(Neste momento, Ronaldo 65, Pauleta 47, Eusébio 41, Figo 32.)
Com toda a sinceridade, olhar para a lista dos melhores marcadores da seleção e ver-me entre três dos maiores jogadores portugueses de todos os tempos – Ronaldo, Eusébio e Figo – dá-me uma felicidade grande, grande!
Fizeste um hat-trick em 2002 – com este, de Ronaldo, só três portugueses fizeram isso em Mundiais. Mais um motivo de orgulho?
Amigo, muito mas mesmo muito. Vivia o sonho de marcar um golo numa fase final do Campeonato do Mundo e, de repente, marquei três no mesmo jogo. Fantástico! Sabes que nessa noite não dormi? Fiquei a recordar o jogo todo na minha cabeça, lance a lance.
Acho que já me tinhas contado isso. Afinal, o que se passou nesse Mundial para, depois de termos dado quatro à Polónia, perdermos com a Coreia e sermos eliminados?
Não quero fugir à questão. Mas já passou o tempo de analisarmos tudo isso. Dir-te-ei que fomos todos culpados! Cometemos muitos erros, erros fatais que nos deixaram de fora. Com muita, muita tristeza, porque esses 23 jogadores foram do melhor que Portugal já teve .
Como vês o teu lugar na história da seleção nacional?
(Quando se trata de modéstia, Pedro Resendes, o Pauleta de Ponta Delgada, ali para os lados de São Roque, freguesia onde nasceu, bate todos aos pontos. Digo eu que o conheço bem. E sublinho.)
Olha, vejo um jogador que em cada jogo, em cada treino, representou o seu país com muito orgulho e dedicação. Dei tudo o que tinha. Nunca me poupei!
Bem sei, meu amigo. E a falta que tens feito à seleção. Quando voltará Portugal a ter um ponta-de-lança como tu?
Ora, não te preocupes, vamos ter vários. É preciso é que não tenham medo de falhar e que não lhes atirem sobre os ombros mais responsabilidades do que, como jovens que são, conseguem suportar.
Ficaste desiludido com a eliminação de Portugal frente ao Uruguai?
Fiquei. Mesmo muito. Estava confiante que iríamos mais longe neste Mundial, ainda por cima depois daquele jogo frente à Espanha. Contra o Uruguai, senti que não tivemos a sorte do jogo a nosso favor. Foi pena…
E agora? Torces pela França? Teria uma certa lógica.
Bem… posso dizer que sim, de certa forma, mas o que quero mesmo é ver golos, muitos, muitos golos.
Quem vai ser o próximo grande ponta-de-lança do futebol português?
Não queria estar a pessoalizar, até porque não me parece justo para os jovens que estão a surgir. Aquilo que vou observando é que temos miúdos com muito talento. Só quero dizer-lhes: não tenham medo de rematar e falhar. Arrisquem! Rematem sempre.
Não foi ainda agora que Ronaldo ultrapassou os nove golos de Eusébio num Mundial. Passou Pauleta: tem sete em quatro fases finais; Pauleta, quatro em duas. Seguem-se Torres e José Augusto com três, ambos em 1966. Um Mundial não é coisa fácil. Nada, nada fácil.