António Costa aproveitou o encerramento das jornadas parlamentares do Partido Socialista, no Alentejo, para fazer uma espécie de declaração de amor aos partidos que apoiam o governo. O secretário-geral do PS deu garantias de que quer uma relação duradoura e não tem nenhum desejo de “mudar de companhia”.
A mensagem de Costa, acompanhada por muitos avisos ao PCP e ao Bloco de Esquerda, não é inocente. Surge numa altura em que a tensão dentro da geringonça está a aumentar por causa das negociações do Orçamento do Estado para o próximo ano e as eleições estão cada vez mais próximas.
A intervenção de António Costa acabou por ser não só uma resposta às críticas da esquerda como uma garantia de que não será por ele que a geringonça vai acabar antes de tempo. “Não estamos nem arrependidos, nem com vontade de mudar”, disse o secretário-geral do PS, depois de ouvir os comunistas e o BE reclamarem pela aproximação do governo à direita.
O líder dos socialistas quis claramente aliviar a tensão, voltou a afastar a ideia do bloco central e falou na necessidade de criar condições para a “continuidade” desta solução à esquerda na próxima legislatura. O risco de uma crise política não é ignorado por ninguém. Marcelo, não há muito tempo, avisou que “uma crise política é indesejável e uma crise política envolvendo o orçamento do Estado é duplamente indesejável”. Ontem, o Presidente da República voltou a alertar que “é bom para o país que não haja crise nenhuma e que, portanto, o orçamento seja aprovado”.
As negociações sobre o orçamento já arrancaram com o BE. O primeiro-ministro reúne-se hoje com uma delegação do Partido Ecologista “Os Verdes. O encontro com o PCP também está para breve. Costa lançou vários avisos aos aliados à esquerda, nomeadamente para a tentação de colocar em causa os resultados alcançados nas contas públicas devido à proximidade das eleições. “Não será seguramente por ser ano de eleições que vamos sacrificar a boa governação ao eleitoralismo. Não vai ser seguramente por ser o último ano da legislatura que vamos pôr em causa tudo aquilo que conquistámos duramente ao longo dos três últimos anos”, disse. Marcelo Rebelo de Sousa foi o primeiro a alertar para a necessidade de “resistir à tentação de ser um orçamento eleitoralista”.
Costa apresentou ainda outros motivos para que a geringonça dure até ao fim da legislatura. “Está no coração dos portugueses” e “o país não está à espera nem a desejar qualquer mudança”. O líder socialista fez, no entanto, questão de lembrar aos parceiros que “todos são importantes”, mas “o PS é essencial para que a geringonça exista e possa funcionar. Só o PS garante o equilíbrio que tem sido a chave do sucesso desta governação”.
César irrita BE e PCP
Mais duro para os parceiros foi o líder parlamentar do PS. Carlos César defendeu que, se abrirem uma crise política, estão condenados ao isolamento. “Nem o PS se desviou do seu percurso, nem os partidos que têm apoiado o governo querem voltar a um regime de isolamento e a uma falta de influência na política portuguesa”. A intervenção de Carlos César não agradou aos bloquistas e ao PCP. Joana Mortágua, deputada do BE, escreve, num artigo de opinião publicado nesta edição, que Carlos César “sempre nutriu uma mal disfarçada desafeição pela geringonça”. A deputada bloquista considera que o PS “escolheu marchar ao centro da avenida para tentar a maioria absoluta”.
Jerónimo de Sousa garantiu que o PCP não está isolado. “Não olhem só para o PCP, olhem para os sentimentos de descontentamento e injustiça que muitos e muitos trabalhadores sentem. Naturalmente, aí estará o PCP, dando voz a esses sentimentos”.
Apesar das críticas dos comunistase do BE, nomeadamente por causa dos professores e das alterações às leis laborais, os socialistas estão convencidos de que a legislatura vai até ao fim. “As pessoas estão satisfeitas com esta solução e ninguém vai contra isso. Há uma negociação para fazer e vai fazer-se”, diz um deputado socialista. Costa também se mostrou otimista e não acredita que “o PEV, o PCP ou o Bloco de Esquerda queiram pôr em causa aquilo que tem sido o sucesso desta solução governativa”.
O Presidente da República ainda não tem nada marcado com os partidos para avaliar o orçamento, mas deve chamá-los antes de ir de férias para perceber se existe risco de crise política.