O PSD e a armadilha do consenso


A grande novidade que Rui Rio trouxe para a política nacional foi o regresso do país aos consensos. Ao que parece, Rio pretende que o partido que ganhou as eleições ajude o que as perdeu a governar. Naturalmente, o PS está disponível. Subjacente a este contrassenso há uma forma de estar na política, uma armadilha…


Desde que me conheço que ouço falar da importância dos consensos. Com a honrosa exceção, e não é a exceção que confirma a regra?, de Sá Carneiro, que exigia unanimidade na luta contra o comunismo, o consenso de que se vai falando é inócuo. Discute-se desde que isso não faça mossa e não prejudique ninguém, não produza o efeito pretendido, seja inofensivo.

Um bom exemplo disso mesmo é a descentralização. Atenção que não digo que a descentralização não seja importante. É. Sucede que, como qualquer reforma digna desse nome, vale a pena se for verdadeira, se implicar uma descentralização da receita dos municípios, a capacidade de as autarquias cobrarem os seus impostos diretamente e não por via do Estado central; se passar por uma descentralização fiscal. 

Como não é o caso, mesmo que PSD e PS cheguem a acordo, o resultado será irrelevante para a resolução do problema que é a concentração dos poderes em Lisboa. Porque o que interessa, o verdadeiro objetivo quando se discute consensualmente a descentralização, é que o país se entretenha com um tema tão amplo quanto vazio e se esqueça dos seus verdadeiros desafios. A economia vai enganadoramente bem e o momento é o propício para que percamos tempo com questões inofensivas em vez de se prevenir a próxima crise. Esta é a habitual forma de estar na política. 

E é precisamente aqui que o PSD corre um sério risco. Como o PS representa o eleitorado que depende inteiramente do Estado, sejam funcionários ou empresários, os socialistas dificilmente perderão votos se tudo fizerem para que os seus eleitores não sejam prejudicados. Ao invés, do PSD espera-se mais porque neste partido votam muitos dos que vivem na economia real. Eleitores que não compreendem por que motivo um partido como o PSD pactua com uma forma de fazer política que não se coaduna com o estado em que o país se encontra. O PS e a extrema-esquerda têm as mãos sujas e tremem só de pensar num PSD com a superioridade moral dos que resgatam o país pela segunda vez. Cair na armadilha do consenso quando o consenso ilude e engana é um erro que o PSD devia evitar a todo o custo.

 

Advogado

Escreve à quinta-feira