Inglaterra. Indiana Flores e os salteadores da League perdida

Inglaterra. Indiana Flores e os salteadores da League perdida


Em terras de Sua Majestade quem tem Pep Guardiola pode ser rei. O treinador espanhol, de malas feitas em Munique no final da temporada, após três anos e cinco títulos no Bayern, tem a fórmula (mágica?) do tiki-taka na bagagem, destino marcado no bilhete de avião e uma confissão.


“Quero treinar na Premier League. Quero ter a experiência das emoções e dos estádios ingleses. Tenho 44 anos e é o momento certo para ir”, revelou ontem em conferência de imprensa. A Premier League também chama por ti ó Pep. City, Chelsea e United até o vão buscar ao aeroporto se for preciso. E o cheque é entregue em branco, para o freguês (leia-se Pep) preencher à sua vontade (ou à vontadinha). Chegamos ao único problema para Guardiola: qual deles escolher?

“Tenho várias ofertas de Inglaterra mas não assinei por ninguém ainda”, rematou, acrescentando que não é pelo dinheiro que sai dos bávaros. Então? Simples, um “novo desafio”. Um parecido ao que o também espanhol Quique Flores aceitou no verão, ao assinar pelo Watford, recém-promovido ao principal escalão do futebol inglês.

Vinte jornadas chegaram para o técnico espanhol cair nas graças dos adeptos e tornar-se uma das sensações do campeonato: 9.º lugar, com 12 pontos de vantagem para os lugares de despromoção e com 13 de atraso para a liderança. Elton John dá pulos de alegria. Ele que durante 35 anos assumiu a presidência do clube do seu coração. Agora a música é outra, tocada pelo sobrinho de Lola Flores, ícone do flamenco de nuestros hermanos.

Nos últimos quatro encontros, o Watford teve pela frente quatro equipas de topo e não se encolheu. Esticou-se. Goleou o Liverpool, de Klopp, em casa (3-0), roubou pontos ao Chelsea em Stamford Bridge (2-2), já com Guus Hiddink no banco, e fez-se caro com o Tottenham e Manchester City (2-1, nos dois jogos). Para quem viu estas últimas duas exibições, fica claro que o resultado não é como o algodão, engana. Mas quem diria quando é Flores que usa a braçadeira de treinador.

Que o digam os adeptos do Benfica, que não guardam saudades. E não são os únicos com o mesmo sentimento de repulsa.

Após pendurar as chuteiras Quique começa por treinar os juvenis do Real Madrid, representa o Getafe e aproveitou a oportunidade no comando técnico do Valência, onde ganhou uma Taça do Rei. Só não contava ser despedido por maus resultados. Foi parar ao Benfica (2008-09), apresentado com pompa e circunstância para duas épocas. Só durou uma. E, mais uma vez, foi despedido por maus resultados.

Voltou a ser feliz no Atlético de Madrid, durante duas épocas (conquistou uma Liga Europa e uma Supertaça Europeia), até lhe abrirem também a porta de saída. Voltou a ser despedido por… problemas internos (os resultados também não ajudaram). A história repetiu-se no Al Ahli e no Getafe, pelos mesmos motivos.

Daí a surpresa do trabalho desenvolvido (até ao momento) no Watford. Não, não serão, à partida, capazes de imitar o feito do Blackburn Rovers, a última equipa a bater o pé aos grandes na corrida ao título da Premier League (1994-95). Isso parece ser uma missão para o Leicester de Claudio Ranieri, o ódio de estimação de Mourinho. Outro treinador que parece sofrer do ‘efeito JJ’, uma vez que está a render o dobro do que é normal.

Aos 64 anos, o italiano, que começou nestas andanças em 1987 (no Puteolana) já passou por 14 clubes diferentes e apenas amealhou meia dúzia de troféus. O melhor que apresenta no currículo é o mérito da ascensão do Mónaco na Liga francesa. Sim, é pouco. Mas agora apresenta-se ao mais alto nível na equipa sensação em Inglaterra. Está no segundo lugar, a morder os calcanhares ao líder Arsenal. E não é caso único, tal como Quique. Também Ronald Koeman revitalizou a carreira na última temporada ao serviço do Southampton, apesar de ter perdido gás este ano. Isto numa época em que Mourinho cai do trono do Chelsea e Van Gaal está por um fio no Manchester United. O que têm todos em comum? O facto de não serem ingleses e dominarem as atenções do país.

Legião estrangeira Quando a 20 de fevereiro de 1992 a Football League First Division se tornou na Premier League, nenhum dos 22 clubes ingleses tinha um treinador com o bilhete de identidade registado fora do Reino Unido. Doze anos depois (2004), quando um português campeão europeu chega ao Chelsea e se apelida de Special One (Mourinho, who else?), cinco estrangeiros ocupavam o banco de suplentes da liga de futebol mais popular do mundo. Hoje, a 6 de janeiro de 2016, apenas oito técnicos britânicos resistem à invasão. Say what?

O domínio na Premier league dos homens que falam inglês com sotaque de fora é avassalador. Até os big five (Arsenal, City, United, Liverpool e Chelsea) estão entregues a mãos estrangeiras. A Holanda é o país mais representado entre as 20 equipas da tabela, com quatro treinadores (Van Gaal, Koeman, Hiddink e Advocaat). Mas também há um argentino (Pochettino no Tottenham), um chileno (Pellegrini no City) e um croata (Bilic no West Ham). Ingleses de gema só 3: Alan Pardew do Newcastle, Eddie Howe do Bournemouth e Steve McClaren do Newcastle.

hugo.alegre@sol.pt