O realizador português João Salaviza estreia, neste mês, a primeira longa-metragem, "Montanha", um filme sobre as angústias de um adolescente, que serve como metáfora de um cineasta também ele em transformação.
"Montanha", que chega aos cinemas no dia 19 e tem uma antestreia no domingo, dia 08, no Lisbon & Estoril Film Festival, é um filme sobre David, um adolescente de 14 anos, que vive os primeiros amores, enfrenta um pai ausente e lida com um avô hospitalizado.
A personagem é interpretada por David Mourato, um actor não profissional que João Salaviza encontrou num processo de várias escolhas e conversas, entre mais de 400 candidatos. No filme, a David Mourato juntam-se ainda Chayenne Rodrigues, Maria João Pinho, Rodrigo Perdigão e Carloto Cotta, estes protagonistas das curtas "Rafa" e "Arena", respectivamente.
Em entrevista à agência Lusa, João Salaviza contou que tinha um guião estruturado para o filme, no qual voltaria a abordar o tema da adolescência – depois da curta "Rafa"-, mas esse guião caiu por terra nos primeiros dias de rodagem.
"Percebi que não estava a aproveitar nada, não estava atento às vidas e especificidades das pessoas que estava a filmar. Estava a tentar que o cinema se impusesse sobre eles quando acho que tem de acontecer ao contrário, que a vida das pessoas se imponha", contou.
Ao mudar o método de trabalho, e a construir o filme sobretudo na mesa de montagem, com o pai, o montador José Edgar Feldman, João Salaviza fez uma obra sobre a adolescência de uma forma “mais sensorial do que factual”, a partir das especificidades de David Mourato.
"Montanha" tem todos os elementos de um filme clássico, diz Salaviza, elencando os ritos de passagem, o primeiro amor, o confronto com o progenitor.
"O meu desejo de filmar passa por uma relação muito concreta com uma pessoa específica, neste caso o David Mourato. O filme passa-se nesse terreno da adolescência, mas eu não tenho nenhuma pretensão de universalizar através das coisas que filmo", contou.
João Salaviza, 31 anos, chega a "Montanha" depois de ter feito uma série de curtas-metragens e com dois prémios de peso no currículo: a Palma de Ouro em Cannes, com "Arena", em 2009, e o Urso de Ouro em Berlim, com "Rafa", em 2012.
O realizador sabe das expectativas perante a primeira longa-metragem. “Montanha” teve estreia mundial no festival de Veneza e acaba de ser premiado no Festival de Montpellier, em França, onde o filme terá estreia comercial em Abril de 2016.
"Acho que deve ser uma pequena tragédia sentir que se faz um filme e depois não é visto por ninguém, não é mostrado. Um filme passar pelo mundo com indiferença é uma tristeza", afirmou.
Enquanto o filme chega aos cinemas portugueses, João Salaviza prepara-se para ir viver uma temporada no Brasil, com a mulher Renée Nader, assistente de realização em "Montanha", e com quem fará o próximo filme.
"É a primeira vez que me afasto mais de dez quilómetros de casa para filmar", constatou. No Brasil irá viver próximo dos Krahô, um povo indígena cuja comunidade tem pouco mais de dois mil habitantes, e que vive no estado de Tocatins. Será o foco do próximo projecto.
O filme será correalizado por Salaviza e Renée Nader, de nacionalidade brasileira, e que já viveu com os Krahô ao longo dos últimos quatro anos.
Não há cortes radicais com o cinema português nem decisões fracturantes ao rumar ao Brasil: "Não tenho uma forma de pensar nada programática sobre fazer filmes. A vida é que me leva a filmar determinadas coisas. No caso dos Krahô foi ter ido parar àquele sítio através da Renée. Fiquei com vontade de ir lá e a única coisa que eu sei fazer é filmes", disse.
Lusa