© Manuel de Almeida/Lusa
Tenho alguma vergonha de achar tão pouco interessante o debate político em Portugal. Uma amiga minha recusa-se a ver futebol alegando que não é desporto mas mera corrupção. Eu – com ainda mais vergonha – continuo a ver futebol com uma espécie de ingenuidade voluntária, mas só vejo debates para picar o ponto da consciência política, com uma contrariedade facilmente detectável pelo tipo de comentário que teço durante a emissão.
Tendo a avaliar a prestação do candidato pelo que consigo vislumbrar de carisma, o que me leva a atentar mais àquele que está calado do que àquele que fala. Como fixa o seu olhar? O que estará a pensar? Aquele sorriso é de confiança ou de nervos? Claro que, no momento do voto, tenho mais em conta o conteúdo do que a forma, mas rendo-me ao juízo mais imediato como quem está a assistir a um pedaço de entretenimento inócuo – o que não me parece estar assim tão longe da verdade a partir do momento em que o futuro do país é interrompido por seis minutos de publicidade.
Apesar de não ser uma cidadã lá muito interventiva, tive uma infância bastante politizada, creio que bem mais do que muita gente que se orgulha de não votar porque nunca ninguém lhes explicou o que significa não ter esse direito. Frases como “vai tudo dar ao mesmo” ou “não gosto de nenhum” são tentadoras, mas denunciam uma ignorância defensiva e arrogante – faz-se de conta que não se quer saber quando, na verdade, não se sabe.
Porém, talvez por excesso de imaginação, vivi a política na infância como quem assiste a uma filme de cowboys, uma coisa de heróis e vilões com motivações tão gratuitas quanto inquestionáveis. Era uma época de poucas distracções e – talvez por isso mesmo – marketing poderoso e, lá está, muito carisma.
Tenho alguma dificuldade – proporcional à vergonha – em achar a política tão ou mais importante do que as agruras filosóficas da minha breve passagem pelo mundo. Luxos de quem sabe menos sobre sobreviver do que sobre viver e, mesmo assim, continua sem saber nada.
Guionista, apresentadora e porteira do futuro
Escreve à sexta e ao sábado