Trabalha como consultora financeira na Stralem & Company há já 42 anos e nunca perdeu um cliente, excluindo os casos em que teve de encerrar contas por morte dos mesmos. A empresa gere mais de dois mil milhões de dólares e os 11 clientes de Bergman confiam totalmente nela. Afinal, se é rica e sabe fazer a gestão do seu próprio capital, porque não haveria de o fazer bem com o dos outros? Além de que afasta quaisquer desconfianças – se já é abastada, não precisa de ir ao bolso de ninguém.
Para a consultora, a receita para o sucesso na selva financeira é simples: “Não faça nada estúpido.” Mas segue outras regras mais específicas que deixariam nervoso quem quer lucros rápidos. Por exemplo, só mexe nos seus investimentos depois de os deixar de molho durante pelo menos três anos, para ganhar uma perspectiva do mercado. Porém, se uma investigação minuciosa indicar que uma mudança é favorável, há que ter coragem para fazer as alterações. E Irene tem.
Aliás, a coragem e o sucesso no mercado financeiro fizeram com que fosse convidada para tocar o sino da abertura da bolsa de valores de Nova Iorque (NYSE), para marcar o seu centésimo aniversário. Será a pessoa mais velha a ter alguma vez tocado o sino da bolsa, naquela que é uma das maiores cerimónias da NYSE, transmitida por meios de comunicação por todo o mundo – gerando exposição a quem o toca e à empresa a que pertence.
O lado cinzento da vida
Irene nasceu em Berlim a 2 de Agosto de 1915 e a travessia até chegar a Wall Street foi uma verdadeira montanha-russa. Desde jovem que pretendia seguir os passos do pai e ser a primeira mulher na bolsa de valores de Berlim, mas a escola representava um desafio. Era dedicada, mas nunca foi considerada a lâmpada mais brilhante enquanto estudante. Enquadrava-se melhor na equitação, desporto que praticava todos os dias. Manteve esse gosto quando se mudou para a Holanda com a família, em 1936, e ainda hoje adora cavalos, tendo apenas parado de montar aos 80 anos.
Passados apenas quatro anos da mudança para os Países Baixos teve de pôr os seus planos em espera para dar prioridade à sobrevivência. Os nazis tinham invadido a Holanda e restava-lhe fugir. Passou pela Alemanha, Suíça, França, Espanha e Portugal.
Foi no nosso país que permaneceu seis meses sem saber o passo seguinte. Até ao dia em que o pai recebeu um convite de um amigo americano para ir para Nova Iorque. Foi graças a esta ajuda que Irene embarcou com outras 700 pessoas num barco que estava projectado apenas para 200. A sua avó, que ficara na Holanda, foi levada para Auschwitz. A fuga pela Europa até chegar à América evitou a Bergman um destino semelhante. Para felicidade de Wall Street.
De secretária a génio das acções
Começou por baixo, como secretária numa associação. Sol de pouca dura, visto que a nacionalidade lhe impunha limitações. E foi novamente um amigo do pai quem a ajudou, oferecendo a Bergman um trabalho num banco, na área das finanças. Foi aí que aprendeu a maioria do que sabe sobre investimentos. Foi assumindo responsabilidades cada vez maiores e em 1957 começa a trabalhar numa empresa que viria a pertencer à bolsa de valores de Nova Iorque, a Hallgarten & Company. Mas o único local de trabalho onde se sentiu “tratada como igual”, em vez de discriminada por ser mulher, foi na Stralem & Company. Confortável com o ambiente de trabalho, deixou-se ficar.
Da mesma forma que a experiência acumulada lhe permite perceber a evolução das acções até ao presente, também consegue carregar no botão mental de avançar e perceber como vão estar no futuro. Ainda assim, é humana, e passou-lhe ao lado a Apple. É o único investimento que se arrepende de não ter feito. Porém, admite toda a responsabilidade: “Sempre gostei de poder fazer o que queria, por isso qualquer erro será sempre falha minha.”
Talvez a falta de família (é solteira e não tem filhos) lhe tenha permitido também uma dedicação extra à carreira que explica parte do sucesso. O único ser vivo dependente de Irene Bergman é uma cadela chamada Fanny. Solitária, é uma senhora de gosto requintado que recebeu com vodca os jornalistas da “Bloomberg” que a visitaram recentemente para uma entrevista acerca do seu centenário. Mas nada de esticar a corda à cordialidade da anfitriã: a mobília de sua casa, maioritariamente fabricada antes da II Guerra Mundial, e as cadeiras Luís XV estão interditas.