© Bruno Simões Castanheira
Há dias prometi revelar um segredo. Aqui vai. Não escrevo mais. Hoje, os leitores verão o meu último artigo desta série. Já há muito ponderava deixar este constante fingimento em que vivo. Não me sinto bem. Ou escrevo o que sei e sinto, isto é, ou digo a verdade, só a verdade e não mais que a verdade, ou não escrevo.
Em Portugal, ao invés do que sucede em países de tradição democrática mais madura, o estatuto de escriba livre ainda não é para todos. Apenas aqueles que vivem do que escrevem e os que têm independência material podem dizer o que pensam. Os outros, ou não pensam e está o assunto resolvido ou, se pensam e trabalham…
A partir de agora, só tinha um caminho. Mentir. Pregar falsas morais, falar sobre o que se vai sabendo de África, da América Latina, da Grécia, da distante Rússia e seus satélites. Escrever a verdade, com a responsabilidade empresarial que vou tendo, com o número de pessoas que já dependem das pequenas empresas que dirijo, seria uma irresponsabilidade.
É verdade que as críticas que faço são mordazes. É verdade que, até para ser coerente com o título da coluna que assino, chamo, como dizemos entre nós, “os bois pelos nomes”. Afinal, um Mural é um mural. Apenas tem de haver moral para nele escrever. Há mesmo um ou outro caso em que acho que exagero. Há mesmo um ou dois visados a quem não me importaria de pedir desculpa pela excessiva frontalidade. Até porque poderia ter-lhes dito pessoalmente o que disse no artigo e ficavam as coisas entre nós. Mas digo e escrevo frontalmente. Não ando a cochichar nas entrelinhas e nas costas.
Não mais poderei dizer que o ministro A, B ou C – alguns não merecem maiúsculas – só diz e, pior, só faz disparates – como dar entrevistas e, depois, vir querer esclarecê-las em conferência de imprensa; não mais poderei dizer que o candidato a, b ou c – estes não merecem mesmo maiúsculas – à Presidência da República de Portugal não tem carácter – nem falo de competência – para ser candidato. Mas é a escolha que faço.
Depois, há a limitação da prosa quando temos – e gostamos de ter – muitos amigos. Uns são amigos de outros, outros são amigos de uns, estes últimos são amigos dos primeiros e, quando damos por ela, acabamos escrevendo sobre alguém que encontramos ao jantar, na semana seguinte, em casa de A, B ou C – com maiúsculas tão grandes quanto a Amizade que nos une. E o jantar cai mal a todos…
Por último, há a questão dos negócios. “Ó doutor, eu até trabalhava consigo, mas bem vê, os seus artigos … Sabe, é que fulano tem muito poder.” Por mim, que já fiz um pouco de tudo, ter dinheiro ou não ter dinheiro, desde que as bocas lá de casa não passem fome, possam ir à escola e tenham dinheiro para cuidar da saúde, tanto se me dá como se me deu que haja mais um ou menos um cliente todos os dias.
Mas os trabalhadores que comigo constroem as empresas, aqueles que comigo partilham a gestão dos projectos em que estamos envolvidos e os clientes que sempre nos deram a honra de contribuir para que tivéssemos criado mais de cem postos de trabalho qualificado, as empresas que a montante e a jusante podem falar da rara honestidade com que nos relacionamos financeiramente – digo rara com orgulho, porque, cada vez mais, vejo gente a pavonear–se e com contas por pagar –, todos eles me fazem repensar a minha liberdade. O 25 de Abril, em matéria de escrita, acaba, para mim, hoje. No pensamento, não havendo machado que lhe corte a raiz, que é como quem diz doença que me afecte, serei sempre livre.
Empresário. Escreve à terça-feira