Filosofia de jogo. O futebol pelos olhos de Jesus

Filosofia de jogo. O futebol pelos olhos de Jesus


Técnico explicou ideias e modo de trabalho em palestra em 2013. O i recupera as declarações para mostrar o que o Sporting quis contratar.


Jorge Jesus tem tanto de excêntrico como de reservado. No banco de suplentes, desdobra-se em indicações repletas de gestos bruscos e chega a invadir a zona delimitada do treinador adversário; em conversa, não gosta de revelar mais do que o estritamente necessário. “Acho que temos de partilhar o saber com as pessoas mas foram trinta anos a queimar pestanas. Algumas coisas vão ficar sempre para mim”, afirmou no momento do arranque da palestra que deu em Março de 2013 na Faculdade de Motricidade Humana, a convite de Manuel Sérgio, o professor que lamenta que “os treinos que ele [Jesus] dá não se possam transformar em aulas universitárias”. “São modelares”, elogia.

Durante cerca de duas horas, Jorge Jesus abriu o jogo. Com algumas fronteiras, é certo, mas ajudou a perceber a forma como olha para o futebol. Desde os cinco fundamentos (criatividade, saber operacionalizar, liderança, organização e paixão) à forma de pensar sistemas e modelos de jogo, ou simplesmente prioridades nas novas aventuras.

A palestra mereceu amplo destaque na altura mas o i decidiu recordar os pontos essenciais agora que o treinador voltou a mudar de clube e vai encontrar uma realidade diferente das anteriores. De alguma forma, ajuda a entender o tipo de impacto que o futebol em Alvalade poderá sofrer, tanto de organização como de modelo de jogo.

O Início O sonho de ser treinador ganhou um novo capítulo com a Laranja Mecânica. “Tinha uma forma de jogar que me apaixonava e queria saber como é que aquilo se fazia”, confessou. Jesus estagiou com Cruijff em Barcelona para entender o 3x4x3 mas reconhece que é muito difícil de operacionalizar. “Os jogadores têm de fazer mais do que uma posição e nem todos têm essa cultura táctica”, afirma.

Sistema de jogo O Benfica jogava em 4x3x3 quando Jesus chegou em 2009 e agora a situação no Sporting é semelhante. O novo técnico dos leões não é um fã do sistema por entender que é o mais fácil de anular. Por outro lado, recorda que “o sistema não são números”. É o tal fundamento, a criatividade, que serve de início de tudo, do modelo de jogo ao de treino passando pelo de jogador. “É a partir daqui que começas a montar o sistema e o posicionamento dos jogadores para elaborar o modelo de jogo”, considera, reforçando a obrigação de saber operacionalizar esse modelo. “Montares um treino em função da tua ideia é a tua criatividade. A teoria é a reflexão da prática: quem pratica e não teoriza, só repete. E quem repete não evolui. Quando vou para casa, vou sempre a pensar no que aconteceu.”

Escolha do capitão Jesus não mexeu no estatuto de Luisão na Luz mas não por uma questão de antiguidade. “O que interessa é ter um capitão que consegue perceber as ideias da equipa, não só do ponto de vista disciplinar como do ponto de vista táctico. Para mim, quando está no jogo, é o treinador dentro de campo. Nunca um me disse para substituir um jogador, mas se acontecer, eu faço-o logo. Como capitão, cheguei a dizer isso”, assume.

Primeira abordagem Jesus não se vai adaptar aos jogadores que terá no Sporting mas sim o inverso: “Onde chego, tenho uma ideia de jogo, um modelo de jogo, olho para os jogadores e para as suas características e faço com que entrem dentro do meu modelo de jogo e ideias. Acredito que faço dele o jogador que quero para o meu modelo.”

prioridades na construção “Começo sempre por uma ideia pela forma como olho para o jogo e pela forma como quero que a minha equipa jogue, no processo ofensivo e defensivo”, afirma, dando depois o passo seguinte: “Trabalho a equipa por sectores, individuais e colectivos, trabalho os jogadores na componente individual. Depois começamos a trabalhar entre sectores colectivamente.”

Defesa vs. Ataque Defender é fácil, atacar não. “Quando vires uma equipa a defender mal, podes pôr em questão o treinador. Aí é ele que tem a grande responsabilidade. Nas minhas equipas, os jogadores não correm quando acham, mas sim em função das ideias que eu quero que a equipa tenha. No ataque é que lhes dou liberdade para criar. Quanto mais puderem inventar melhor, mas obrigo a equipa a dar-lhes criatividade posicional para as coisas serem mais fáceis. Trabalhamos dentro destes princípios e é tudo muito bonito, mas o treinador é como o jogador: sem talento não dá em nada.”