“O PS é um partido velho, complexado, castrador da capacidade de intervenção dos cidadãos, e passa sucessivamente à margem das aspirações dos portugueses.” Parece mas não é uma frase da oposição. A crítica é do actual líder do PS e foi proferida há 21 anos, quando era presidente da Juventude Socialista (JS).
Antes de chegar aos 30, António José Seguro aumentou a influência da sua jota dentro do partido, chocou o país nas legislativas de 1991 ao distribuir 250 mil preservativos de camisola amarela e suspensórios vermelhos e arranjou ainda tempo para gozar a juventude, estragando o seu Opel Corsa em campanha eleitoral e admitindo que o charro era “um prazer”.
O actual líder da oposição tornou-se uma sensação na campanha para as legislativas de 1991 ao fazer uma proposta arrojada aos jovens portugueses. “Deixa-me seduzir-te” era o mote de uma iniciativa que pretendia levar os mais jovens às urnas através da distribuição de 250 mil preservativos em actos de campanha. A mascote “Rosinha”, associada à frase aliciante, valeu a Seguro destaque numa eleição que não foi memorável para os socialistas – Sampaio perdeu contra a segunda maioria absoluta de Cavaco. Mas o presidente da JS foi considerado um vencedor. Nas páginas do “Expresso”, no rescaldo das eleições, Seguro é louvado por levar a que “pela primeira vez houvesse juventude na campanha do PS”.
Sair-se bem em condições adversas não era uma novidade para Seguro. O jovem de Penamacor ascendeu ao topo no seio de uma JS afundada em dívidas, com a sede penhorada e apenas com direito a “um telefone de moedas”. Apesar de ser a juventude partidária mais antiga entre os partidos com assento parlamentar, a JS não tinha financiamento próprio e era ainda conduzida pela geração do PREC. “O PS olha para a JS muitas vezes como um estorvo ou em momento de necessidade”, afirmou Seguro no congresso que o elegeu presidente daquela organização, citado pelo “Expresso” em Abril de 1990.
Um milagre seguro Em 1989, António José Seguro é um rapaz ocupado. É ao mesmo tempo presidente do Conselho Nacional da Juventude, presidente do Fórum de Juventude da Comunidade e dirigente da JS há seis anos. Mas tem apenas duas ambições: ser feliz e ser ele próprio – segundo aponta à edição de 30 de Junho desse ano do jornal “O Independente”. Mas mais responsabilidades estão a caminho. Apesar dos atritos entre os dois, José Apolinário (ex-presidente da Câmara de Faro e actual presidente da Docapesca), presidente da JS desde 1984, queria passar o testemunho de uma JS enfraquecida e encontrou em Seguro um fiel depositário do presente envenenado. O entendimento entre os dois surpreendeu os militantes da própria jota, pois os conflitos entre ambos eram constantes.
Desde o início, Seguro recusou o rótulo de “candidato de gabinete” ao insistir que a sua candidatura não fora negociada com Apolinário e que o seu projecto era de ruptura “com o marasmo” em que dizia viver a JS, segundo declarações ao “Expresso” em Fevereiro de 1990. Na altura a JS estava tão mal de finanças que nem conseguia arranjar os 6500 contos para a organização do congresso, em Abril desse ano, apesar dos apelos de Seguro ao então líder do partido, Jorge Sampaio. Felizmente a criatividade que levará daí a um ano esta juventude a entregar preservativos em troca de votos já abundava e a JS consegue organizar o seu congresso através de patrocínios e de descontos no alojamento em Tróia. Fez-se um “milagre”, segundo António José Seguro – que até admitia ser “um mau católico”.
E foi assim que o jovem que só queria ser ele próprio chegou à liderança da JS. Entre opositores e dificuldades financeiras, Seguro lá arrebatou a maioria dos delegados ao congresso, salientando em declarações ao “Expresso” que o encontro serviu para dar “prestígio” à jota, e concluindo que de uma organização “sem alma” tinha saído “uma nova JS”.
Tudo Seguro Entre as responsabilidades que tinha assumido e os “objectivos definidos” que se propôs, Seguro ainda tinha tempo para ser jovem. Em resposta ao “Independente”, o socialista diz que o charro é “um prazer”, uma noite bem passada seria com “uns olhos bonitos” e que o seu local de eleição para a diversão nocturna é, “naturalmente, o Plateau”. Elege como filme favorito “Nove Semanas e Meia”, admite já ter visto filmes pornográficos no cinema e a coisa mais ousada que gostaria de fazer seria protagonizar o tal “Nove Semanas e Meia” com… Julia Roberts (a protagonista, Kim Basinger, não era “nada de especial”). Mas a vida não era fácil para o líder da JS: Seguro assumia, como qualquer jovem, não ter dinheiro. A sua casa (constituída por uma assoalhada e uma kitchenette) servia apenas “para dormir e descansar”, confidenciou em entrevista ao “Expresso” a 12 de Outubro de 1991.
O carro (peça central da vida de um jovem) perdeu-o com uma avaria na campanha eleitoral desse ano, em que fez acompanhar o candidato socialista Jorge Sampaio de vários elementos da juventude do partido, vestidos de camisola amarela e suspensórios vermelhos. A manobra não deu a vitória a Sampaio, mas juntamente com os preservativos pôs os jornais a falar de Seguro.
Ele que um dia disse que o seu lema era “gostem de mim ou odeiem-me”, afirmando que o que não suportava era a indiferença, teve de lidar com o melhor e com o pior da fama. Ao mesmo tempo que o “Expresso” lhe atribuía o grau Morno na escala Quente & Frio, concluindo que, apesar da distribuição “duvidosa” de preservativos, “a irreverente promoção de sexo Seguro é uma das poucas coisas que vieram animar a campanha eleitoral”, Vasco Pulido Valente, no seu espaço de opinião no “Independente”, não perdoou. “Os preservativos não são sedutores; os preservativos da JS presumivelmente têm buracos. E o putativo valor sanitário da ideia não compensa o seu indescritível mau gosto”, escreveu o historiador em Setembro de 1991.
Seguro no poder Mesmo sem vitória do partido, António José Seguro é eleito pela primeira vez em 1991 para a Assembleia da República. Vai bater-se por temas ligados à juventude, como o fim do serviço militar obrigatório. E volta a sair vitorioso de algumas dessas batalhas. No entanto, dentro do PS, a disputa da liderança entre Guterres e Sampaio deixa o jovem líder dividido.
O “Expresso” dá como certa a sua passagem para os apoiantes de Guterres, mas em Janeiro de 92 Seguro esclarece que a JS não apoiará nenhum dos candidatos. Classifica o partido como “velho”, “complexado”, “castrador”, propondo a sua refundação, de modo a voltá-lo de novo para “as grandes causas humanas”. “O PS é um partido triste e amargurado consigo próprio”, rematou então Seguro.







