Protocolo. “As universidades portuguesas são exportadoras de conhecimento”


No passado dia 25 de Janeiro, o ISLA Campus de Lisboa e o ISCTE – Instituto Universitário assinaram um protocolo que visa o desenvolvimento de actividades académicas e de investigação comuns


No passado dia 25 de Janeiro, o ISLA Campus de Lisboa e o ISCTE – Instituto Universitário assinaram um protocolo que visa o desenvolvimento de actividades académicas e de investigação comuns. O documento vai ser potenciado pela ligação do ISLA ao grupo Laureate, que possui 55 universidades em 29 países, e ajudar à internacionalização do ensino superior português. Esse desafio é cada vez maior numa economia global, em que as universidades concorrem no conhecimento e no recrutamento de alunos e professores de todo o mundo. O i falou com os responsáveis do ISCTE, do ISLA e da Laureate.

Qual é a vantagem para o ISCTE de firmar este protocolo com uma outra escola nacional como o ISLA?


Luís Reto (reitor do ISCTE) – Já ninguém tem recursos para fazer tudo sozinho. Grande parte das questões de hoje resolvem-se com parcerias e consórcios. Numa área do trabalho tradicional do ISLA e que recentemente é também nossa, que é a da hospitality management, vimos que era interessante juntar esforços para fazer qualquer coisa de forte do ponto de vista internacional. No caso do ISCTE começamos por cima, com um mestrado com a Central Florida. A nossa ideia é aproveitar a experiência do ISLA, a ligação internacional do grupo Laureate, de que o ISLA é parte, mais a nossa experiência de gestão e investigação e potenciar um projecto internacional de excelência.


O ISLA e o ISCTE têm áreas complementares, mas também têm outras que são concorrenciais. Como é possível fazer um protocolo?


Luís Reto – Em termos das empresas nos dias de hoje compete-se e coopera-se [risos], mas nós não somos assim tão concorrenciais. Por um lado, nós sendo público estamos obrigados a um conjunto de regras a nível das licenciaturas a que o ISLA não está: componente nacional de acesso e os numeros clausus que o ministério nos dá.


Tawfiq Rkibi (director académico do ISLA Campus Lisboa) – Queria dizer que há um espaço de uma grande complementaridade em meios e recursos. A investigação científica é algo que exige muitos meios humanos e financeiros e, como disse o professor Luís Reto, hoje em dia dificilmente se consegue atingir resultados de excelência sem parcerias e consórcios. Esta nossa união veio alavancar este campo de investigação, que para nós, ISLA Campus de Lisboa, é crucial. O ISLA tem a ambição de se tornar uma instituição de referência quer para os estudantes quer para os empregadores. A nossa colaboração com o ISCTE vai proporcionar- -nos benefícios mútuos.


Para uma rede académica internacional como a Laureate, qual é a importância de ter o ISCTE como parceiro?


Nelson Santos de Brito (director-geral do ISLA) – Para a Laureate é muito importante. Quando investimos em Portugal fizemo-lo a pensar na lusofonia. Hoje a Laureate tem mais de 157 mil estudantes que têm o português como idioma principal, dos quais mais de 150 mil são brasileiros. Achamos que o português pode marcar a diferença no universo Laureate. Juntar num projecto duas escolas de qualidade como o ISCTE e o ISLA, com vontade de fazer acontecer coisas, mas não apenas para fazer coisas no powerpoint, permite à Laureate beneficiar desta cooperação. E o país beneficiará também com ela. Desde que entrámos em Portugal, no passado 1 de Abril, estamos dispostos a trazer projectos de maior qualidade, neste caso com o ISCTE na área da hospitality management, em que a Laureate tem algumas das melhores escolas do mundo. Com as competências do grupo Laureate, do ISCTE e do ISLA, estamos convencidos que vamos conseguir trazer melhores investigadores e docentes e que o país pode ganhar com um projecto deste tipo. Um projecto internacional de excelência que crie profissionais globais que possam trabalhar em Portugal, no Brasil, na China ou em qualquer parte do mundo.


Luís Reto – A nossa experiência mostra que a vivência noutros sítios é quase mais fundamental que aquela que se adquire nas aulas. Não é possível criar profissionais internacionais que não tenham vivências internacionais. A parte de cosmopolitismo só se atinge quando a gente encontra os outros diferentes e está com eles diariamente. Só podemos formar gestores globais se eles tiverem essa experiência.


Estas necessidades de internacionalização não tornam os cursos completamente incomportáveis para a maior parte das pessoas?


Luís Reto – Pelo contrário, se for com parceria esta formação torna-se menos inacessível. Repare, nós no ISCTE temos um acordo com a Central Florida. Se o estudante português fosse daqui para a Florida, pagava 40 mil euros para ter uma formação que com a nossa parceria custa 13 mil euros. Temos também uma parceria de um energy MBA com a Columbia, de Nova Iorque. Se um estudante fosse directamente para lá, pagaria 87 mil dólares. Aqui paga 37 mil por um ano e meio, com o semestre nos Estados Unidos. É evidente que estamos a formar elites e não a massa. Mas estas parcerias tornam a internacionalização muito mais barata e acessível.


Nelson Santos de Brito – O Luís Reto estava a falar de uns exemplos e eu posso reforçar o que ele diz com outros: os estudantes que nós temos em Chicago, pelo facto de estarmos inseridos num grupo global, estão a pagar a mesma coisa que pagariam em Lisboa em Chicago. Se o ISLA não tivesse sido adquirido por este grupo, o Laureate, pagariam quatro vezes mais: a propina são 15 mil dólares por semestre. E eles estão a pagar o mesmo que estariam a pagar aqui. O nosso mestrado internacional com passagens em São Paulo e em Xangai não custa o mesmo que pagar propinas na pública, mas tem um preço muito mais razoável que se alguém fosse fazer directamente o mesmo. Pode permitir a muito mais pessoas a experiência internacional que antigamente apenas os ricos conseguiam ter. Esta experiência é cada vez mais relevante do ponto de vista curricular. Os nossos alunos de Chicago diziam-nos no outro dia: é fantástico estar em Chicago, temos 50 nacionalidades diferentes na universidade e estamos a aprender com todas essas pessoas e vamos estar muito mais bem preparados. Não é para todos, mas um programa com estas parcerias torna–se possível para muito mais gente.


O que é preciso para apoiar mais este processo de internacionalização das universidades portuguesas?


Luís Reto – Já disse isto a alguns ministros. Nós temos capacidade nas universidades portuguesas para exportarmos conhecimento. Toda a gente fala em apoiar as PME para exportação, mas nunca ouvi falar de apoiar as universidades para a exportação. Não há nenhum país que não tenha instituições estatais para ajudar as universidades a internacionalizar-se. O ISCTE tem dois cursos na China. Quando lá estive a última vez encontrei lá a Universidade de Sevilha, que tem lá dois escritórios apoiados pelo governo espanhol. Nós fomos sem um tostão de apoio. As universidades portuguesas evoluíram imenso. Temos um curso com o MIT que eles próprios reconhecem que tem muita qualidade. Temos capacidade de atrair estudantes estrangeiros. Somos exportadores, mesmo do ponto de vista das conferências internacionais. Este ano vamos realizar a conferência europeia de marketing, em Maio. Tivemos mais de mil inscrições para comunicações. São mais de mil pessoas que se vão deslocar a Lisboa. E não são pessoas quaisquer, são os responsáveis de marketing de todas as universidades da Europa. Mas nunca se pensa que as universidades dão valor acrescentado à sociedade. Para alguns responsáveis governamentais parece que ainda estamos na Idade Média.


É interessante a particularidade do vosso protocolo de juntar uma universidade privada com uma pública…


Luís Reto – Acho que é o primeiro [risos].


Tawfiq Rkibi – É verdade, mas aquilo que as une é que são duas boas universidades. Aliás, cada vez mais aquilo que importa não é que uma escola seja pública ou privada, mas se tem qualidade ou não. Devemos olhar para os nossos projectos de uma perspectiva de qualidade e de excelência. Este protocolo permite a construção de um projecto de qualidade que por acaso é feito entre uma universidade privada e outra pública.


A crise limita o vosso projecto?


Nelson Santos de Brito – Este momento vai servir para fazer algumas coisas que o ensino superior já devia ter feito há mais tempo. É impossível que continuem a existir 90 instituições privadas de ensino superior em Portugal e 40 públicas, com a diminuição da natalidade. Mas para projectos de qualidade como o ISCTE e o ISLA haverá sempre espaço.