O esquentador da GALP – não aquece nem arrefece


Os grandes escândalos financeiros têm exposto a ineficácia dos Códigos de Conduta, Compliance e de Ética existentes. Os custos públicos dos prejuízos privados recomendam que as empresas fiscalizem o seu cumprimento interno, senão parecem-se com um esquentador avariado – não aquece nem arrefece. 


Abateu-se sobre a República mais uma vergonha devido ao caso dos secretários de estado que a GALP levou à bola. Por mera curiosidade, interessar-me-ia o enquadramento contabilístico que vai ser dado à restituição prometida pelo Sr. Prof. Doutor Fernando Rocha Andrade, sem violar mais nenhuma regra fiscal e financeira a que a GALP, ele e todos nós estamos obrigados. Aguardemos a resposta judiciária.

Desde 2001, vêm-se registando sucessivas alterações legais, cada vez mais “ferozes”, para punir condutas corruptíveis, tendo culminado no crime de Recebimento indevido de vantagem – do art.º 372 do código penal. Ao mesmo tempo, há quem entenda que a Corrupção no sector privado, quando comparada com a que ocorre no sector público, tem uma danosidade social inferior, pois resulta de um cálculo de vantagem para a empresa (representada pelos órgãos de gestão). Discordo! E não creio que os lesados do BPN, do BES e outros concordem. Isto para não falar nos efeitos públicos dos prejuízos privados.

É preciso perceber que uma empresa privada é uma pessoa jurídica, distinta dos seus sócios, e que o administrador não “é o dono disto tudo”! Tanto mais que, hoje em dia, as empresas têm de servir mais públicos para além dos seus “donos”. No Código de Governo das Sociedades do IPCG discutem-se, entre outros, os deveres dos Administradores e demais órgãos perante as respetivas instituições, por forma a promover uma boa gestão. Ora. uma boa gestão é, em qualquer circunstância, aquela que cumpre os objetivos rentabilizando os recursos. Uma empresa pode ter vários objetivos. No entanto, apenas um viabiliza a sua sobrevivência no mercado: aquilo a que, para arrepio de alguns, se chama maximizar o lucro.

A GALP não é exceção. Tem por objetivo maximizar lucros e, para tal, tem de ser bem administrada!  O facto de o Estado português deter uma participação de 7% na GALP, através da Parpública SGPS, S.A., justifica o interesse público pela sua boa gestão e torna o silêncio suspeito.

São só amendoins

Os patrocínios da GALP à seleção nacional não escapam ao raciocínio de eficiência económica. Tratam-se de operações de marketing gigantes que têm como finalidade aumentar a visibilidade da empresa e dos seus produtos. As viagens custeadas aos políticos ou objetivaram uma rentabilização económica, tal como o patrocínio à seleção, ou a administração anda a prendar amigos às custas da empresa e seus acionistas. Sabemos que o orçamento para marketing da GALP é muito grande e sabemos que umas viagenzinhas para uns políticos irem à bola são “peanuts”… -onde é que eu já vi isto?! Mas também sabemos das experiências em Sete-Rios, o que se consegue amestrar com amendoins….

Um esquentador avariado na GALP

Na nota de abertura da Conferência do OBEGEF – Observatório de Economia e Gestão de Fraude, em novembro passado, confessava o Dr. Carlos Tavares, presidente da CMVM, o seu desencanto pela autorregulação, pois os escândalos financeiros dos últimos anos revelaram a estrondosa ineficácia de todos os Códigos de Conduta, Compliance e de Ética que existiam nas instituições que sucumbiram. Diria eu: parecem-se com um esquentador avariado – não aquece nem arrefece.

Também a GALP tem o seu programa de Compliance , onde consta expressamente que: “A GALP ENERGIA garante a proibição de ofertas [a] funcionário público (…)  qualificando-se estas práticas como de corrupção. (…) Estas proibições (…) incluem (…) viagens, passeios (…) oferecidos a (…) entidades públicas (…) com quem a Galp Energia se relacione”.

Mas, também na GALP, esse comando interno de autorregulação não funcionou – semelhante a um esquentador avariado!

Compliance, corrupção & o risco empresarial

Confunde-se, frequentemente, a gestão de Compliance com a gestão de Risco. Todavia, estas duas não se substituem, complementam-se. Senão vejamos: os programas de Compliance não são mais do que um conjunto coordenado e abrangente de políticas, procedimentos, funções e responsabilidades. Este é estruturado para prevenir e detetar desvios comportamentais e promover uma cultura que incentiva a conduta ética e o cumprimento da lei. A gestão de Risco, por seu lado, também tem como finalidade identificar e mitigar riscos e requer igualmente (a) discussão com a gestão de topo sobre temas interligados, (b) inventariação das atividades empresariais e seus mecanismos de apoio dentro da organização, e (c) monitorização das métricas em sobreposição. Mas, embora as iniciativas de gestão de Risco de uma organização se poderem sobrepor significativamente à implementação dos seus planos de Compliance, o primeiro tem um foco estratégico enquanto o segundo serve um propósito mais operacional. Ora, é justamente pela avaliação correta dos riscos envolvidos que se distingue um pensamento estratégico competente.

O exemplo vem de cima

Numa organização onde a administração de topo não compreende os riscos de corrupção – apesar de os formalizar – não pode vingar uma cultura de integridade, pois o exemplo vem de cima – tone from the top! É por isso que os esforços de Compliance são frequentemente frustrados, visto os administradores não perceberem, nem anteciparem riscos futuros (vejam-se os casos conhecidos). Importa perceber que um evento destes (non-Compliance), para uma empresa como a GALP, constitui um risco específico que pode resultar em enorme adversidade para si (p.ex. danos reputacionais, multas, sanções criminais e no limite interrupção dos negócios). É pelo potencial disruptivo, que os riscos de incumprimento e Corrupção (non-Compliance) se inserem na dimensão maior dos riscos operacionais, estratégicos, financeiros e de mercado.

Fiscalizar a gestão

Então como atender às preocupações e receios do Dr. Carlos Tavares?

Antes de mais, é preciso entender que, num país com um PIB de mais de 90mil milhões EUR, as empresas não podem todas ser policiadas. Compete ao conselho fiscal, presidido pelo Dr. Daniel Bessa, pelos mecanismos próprios, fiscalizar a administração da GALP, mesmo quando está em causa o incumprimento de regras de conduta – ou sobretudo nesses casos. Como noutros casos da nossa história empresarial recente: onde está ele? E onde está o auditor externo – a PWC?

É claro que se foram todos juntos à bola, compreendemos que, depois das “bejecas” agora ninguém queira apanhar as cascas dos amendoins! Por fim, para resolver estes casos no futuro, o governo também já prometeu o seu próprio Código de Conduta – mais um “esquentador”?


O esquentador da GALP – não aquece nem arrefece


Os grandes escândalos financeiros têm exposto a ineficácia dos Códigos de Conduta, Compliance e de Ética existentes. Os custos públicos dos prejuízos privados recomendam que as empresas fiscalizem o seu cumprimento interno, senão parecem-se com um esquentador avariado – não aquece nem arrefece. 


Abateu-se sobre a República mais uma vergonha devido ao caso dos secretários de estado que a GALP levou à bola. Por mera curiosidade, interessar-me-ia o enquadramento contabilístico que vai ser dado à restituição prometida pelo Sr. Prof. Doutor Fernando Rocha Andrade, sem violar mais nenhuma regra fiscal e financeira a que a GALP, ele e todos nós estamos obrigados. Aguardemos a resposta judiciária.

Desde 2001, vêm-se registando sucessivas alterações legais, cada vez mais “ferozes”, para punir condutas corruptíveis, tendo culminado no crime de Recebimento indevido de vantagem – do art.º 372 do código penal. Ao mesmo tempo, há quem entenda que a Corrupção no sector privado, quando comparada com a que ocorre no sector público, tem uma danosidade social inferior, pois resulta de um cálculo de vantagem para a empresa (representada pelos órgãos de gestão). Discordo! E não creio que os lesados do BPN, do BES e outros concordem. Isto para não falar nos efeitos públicos dos prejuízos privados.

É preciso perceber que uma empresa privada é uma pessoa jurídica, distinta dos seus sócios, e que o administrador não “é o dono disto tudo”! Tanto mais que, hoje em dia, as empresas têm de servir mais públicos para além dos seus “donos”. No Código de Governo das Sociedades do IPCG discutem-se, entre outros, os deveres dos Administradores e demais órgãos perante as respetivas instituições, por forma a promover uma boa gestão. Ora. uma boa gestão é, em qualquer circunstância, aquela que cumpre os objetivos rentabilizando os recursos. Uma empresa pode ter vários objetivos. No entanto, apenas um viabiliza a sua sobrevivência no mercado: aquilo a que, para arrepio de alguns, se chama maximizar o lucro.

A GALP não é exceção. Tem por objetivo maximizar lucros e, para tal, tem de ser bem administrada!  O facto de o Estado português deter uma participação de 7% na GALP, através da Parpública SGPS, S.A., justifica o interesse público pela sua boa gestão e torna o silêncio suspeito.

São só amendoins

Os patrocínios da GALP à seleção nacional não escapam ao raciocínio de eficiência económica. Tratam-se de operações de marketing gigantes que têm como finalidade aumentar a visibilidade da empresa e dos seus produtos. As viagens custeadas aos políticos ou objetivaram uma rentabilização económica, tal como o patrocínio à seleção, ou a administração anda a prendar amigos às custas da empresa e seus acionistas. Sabemos que o orçamento para marketing da GALP é muito grande e sabemos que umas viagenzinhas para uns políticos irem à bola são “peanuts”… -onde é que eu já vi isto?! Mas também sabemos das experiências em Sete-Rios, o que se consegue amestrar com amendoins….

Um esquentador avariado na GALP

Na nota de abertura da Conferência do OBEGEF – Observatório de Economia e Gestão de Fraude, em novembro passado, confessava o Dr. Carlos Tavares, presidente da CMVM, o seu desencanto pela autorregulação, pois os escândalos financeiros dos últimos anos revelaram a estrondosa ineficácia de todos os Códigos de Conduta, Compliance e de Ética que existiam nas instituições que sucumbiram. Diria eu: parecem-se com um esquentador avariado – não aquece nem arrefece.

Também a GALP tem o seu programa de Compliance , onde consta expressamente que: “A GALP ENERGIA garante a proibição de ofertas [a] funcionário público (…)  qualificando-se estas práticas como de corrupção. (…) Estas proibições (…) incluem (…) viagens, passeios (…) oferecidos a (…) entidades públicas (…) com quem a Galp Energia se relacione”.

Mas, também na GALP, esse comando interno de autorregulação não funcionou – semelhante a um esquentador avariado!

Compliance, corrupção & o risco empresarial

Confunde-se, frequentemente, a gestão de Compliance com a gestão de Risco. Todavia, estas duas não se substituem, complementam-se. Senão vejamos: os programas de Compliance não são mais do que um conjunto coordenado e abrangente de políticas, procedimentos, funções e responsabilidades. Este é estruturado para prevenir e detetar desvios comportamentais e promover uma cultura que incentiva a conduta ética e o cumprimento da lei. A gestão de Risco, por seu lado, também tem como finalidade identificar e mitigar riscos e requer igualmente (a) discussão com a gestão de topo sobre temas interligados, (b) inventariação das atividades empresariais e seus mecanismos de apoio dentro da organização, e (c) monitorização das métricas em sobreposição. Mas, embora as iniciativas de gestão de Risco de uma organização se poderem sobrepor significativamente à implementação dos seus planos de Compliance, o primeiro tem um foco estratégico enquanto o segundo serve um propósito mais operacional. Ora, é justamente pela avaliação correta dos riscos envolvidos que se distingue um pensamento estratégico competente.

O exemplo vem de cima

Numa organização onde a administração de topo não compreende os riscos de corrupção – apesar de os formalizar – não pode vingar uma cultura de integridade, pois o exemplo vem de cima – tone from the top! É por isso que os esforços de Compliance são frequentemente frustrados, visto os administradores não perceberem, nem anteciparem riscos futuros (vejam-se os casos conhecidos). Importa perceber que um evento destes (non-Compliance), para uma empresa como a GALP, constitui um risco específico que pode resultar em enorme adversidade para si (p.ex. danos reputacionais, multas, sanções criminais e no limite interrupção dos negócios). É pelo potencial disruptivo, que os riscos de incumprimento e Corrupção (non-Compliance) se inserem na dimensão maior dos riscos operacionais, estratégicos, financeiros e de mercado.

Fiscalizar a gestão

Então como atender às preocupações e receios do Dr. Carlos Tavares?

Antes de mais, é preciso entender que, num país com um PIB de mais de 90mil milhões EUR, as empresas não podem todas ser policiadas. Compete ao conselho fiscal, presidido pelo Dr. Daniel Bessa, pelos mecanismos próprios, fiscalizar a administração da GALP, mesmo quando está em causa o incumprimento de regras de conduta – ou sobretudo nesses casos. Como noutros casos da nossa história empresarial recente: onde está ele? E onde está o auditor externo – a PWC?

É claro que se foram todos juntos à bola, compreendemos que, depois das “bejecas” agora ninguém queira apanhar as cascas dos amendoins! Por fim, para resolver estes casos no futuro, o governo também já prometeu o seu próprio Código de Conduta – mais um “esquentador”?